quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

FUGA, de Graciliano Ramos







A vida na fazenda se tornara difícil. Sinhá Vitória benzia-se tremendo, manejava o rosário, mexia os beiços rezando rezas desesperadas. Encolhido no banco do copiar, Fabiano espiava a caatinga amarela, onde as folhas secas se pulverizavam, trituradas pelos redemoinhos, e os garranchos se tornciam, negros, torrados. No céu azul as últimas arribações tinham desaparecido. Pouco a pouco os bichos se finavam, devorados pelo carrapato. E Fabiano resistia, pedindo a Deus um milagre.


Mas quando a fazenda se despovoou, viu que tudo estava perdido, combinou a viagem com a mulher, matou o bezerro morrinhento que possuíam, salgou a carne, largou-se com a família, sem se despedir do amo. Não poderia nunca liquidar aquela dívida exagerada. Só lhe restava jogar-se no mundo, como negro fugido.





(Vidas Secas)



(Ilustração: Portinari - retirantes)


2 comentários:

  1. Esse trecho do livro retrata o que? Despovoamento da fazenda; a dívida que o mesmo tinha com seu patrão ou a fuga da seca?
    Obrigada!

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    1. "Vidas Secas" é um romance cíclico. Começa e termina com uma seca. Este pequeno trecho é o começo do livro, começo da seca, quando se inicia a peregrinação do sertanejo Fabiano em busca de dias melhores para si e para a família. Um abraço, Monique, e obrigado pela visita.

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