segunda-feira, 18 de agosto de 2025

O ESTUDANTE ALSACIANO, de Acácio Antunes


Antigamente, a escola era risonha e franca.

Do velho professor, as cãs e a barba branca

infundiam respeito e impunham simpatia,

modelando as feições do velho que sorria.

Era como criança em meio às crianças,

como ao pombal voando,

em bando, as pombas mansas

corriam todos

para a escola e nem sequer assomo

de aversão ou desgosto

sentiam ao ir para ali

como quem vai a uma festa

ao começo, ao estudo,

sem pezar abandonavam tudo

de bancos em fileiras

iam sentar-se em frente às carteiras



gravemente atentos, uns pequeninos sábios.

E o velho professor, tendo sempre nos lábios

ia ensinando a este, emendando àquele,

de manso, com carinho e paternal amor.

Por fim, tudo mudou: agora o professor

é um velho austero e conciso

nunca os lábios se lhe abriam

à sombra de um sorriso.

E aos pequenos transformou

num calabouço a escola:

pobres asas sem dó

metidas na gaiola.



Lá dentro o francês é língua morta e muda

unicamente o alemão se fala e estuda;

são alemães os livros, o mestre, a lição.

A Alsácia é alemã, o povo é alemão.

Como na própria Pátria, é triste ser proscrito!



Frequentava também a escola, um rapazito

de severo perfil, enérgico e expressivo,

de olhar inteligente e vivo

mas na íntima tristeza daquele olhar velado,

no modesto trajar, de luto carregado,

doze anos só teria. E o mestre uma vez

chamou-o à Geografia.

-– Diz-me aí, rapaz, que é isto,

estás de luto, quem te morreu?

– Meu pai, no último reduto em defesa da Pátria.

– Ah, sim... bem. Adiante,

tu tens um ar de ser bom estudante.

– Quais são as principais nações da Europa? Vá.

– As principais são... a França...

– Hei, que é lá, com que então a França é a

primeira? Bom começo...

– De todas as nações, pateta, que conheço

aquela que mais vale e que domina o mundo

em esplendor nas letras e nas artes,

que irradia ciência a iluminar a terra,

a mais nobre na paz, a mais forte na guerra,

a mais, que das demais desdenha,

fica-o tu sabendo, rapaz, é a Alemanha.

Com ar desprezador e altivo

a cabeça agitando num gesto negativo

com voz firme tornou: – A França é a primeira!

O mestre, furioso, ergue-se da cadeira, bate o pé

e uma praga enérgica se lhe escapa.

– Tu sabes onde está a França? Aponta-ma no mapa.



Com o rosto afogueado, os olhos fulgurantes,

enquanto os demais estudantes

olham cheios de assombro

aquele destemido rapaz,

nervos, tímido, comovido,

o cobarde feito herói, pigmeu tornado atleta,

desabotoando febril a blusa preta

batendo no peito, impávida criança exclama:

– É aqui, é aqui dentro que está a França.



(Ilustração : Henri Jules Jean Geoffroyf, en classe le travail des petits - 1889)

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