sábado, 13 de junho de 2015

CRÔNICA DA CIDADE DE CARACAS, de Eduardo Galeano





— Preciso de alguém que me escute — gritava. — Dizem sempre que é para eu voltar amanhã! — gritava. Jogou a camisa fora. Depois, as meias e os sapatos. José Manuel Pereira estava parado na marquise de um décimo oitavo andar de um edifício em Caracas.

Os policiais quiseram agarrá-lo e não o conseguiram. Uma psicóloga falou com ele da janela mais próxima. Depois, um sacerdote levou a ele a palavra de Deus.

— Não quero mais promessas! — gritava José Manuel. Dos janelões do restaurante da Torre Sul, viam Manuel em pé na marquise, com as mãos pregadas na parede. Era a hora do almoço, e este acabou sendo o tema de conversa em todas as mesas.

La embaixo, na rua, tinha se juntado uma multidão.

Passaram-se seis horas.

No fim, as pessoas estavam cansadas.

— Decida-se de uma vez — diziam as pessoas —. Que se jogue de uma vez e pronto! — pensavam.

Os bombeiros aproximaram uma corda. No começo, ele não deu confiança. Mas finalmente esticou uma das mãos, e depois outra, e agarrado na corda deslizou até o décimo sexto andar. Então tentou entrar pela janela aberta e escorregou e despencou no vazio. Ao bater no chão, o corpo fez um ruido de bomba que explode.

Então as pessoas foram embora, e foram embora os vendedores de sorvete e de cachorro-quente e os vendedores de cerveja e de refrigerantes em lata.


(O Livro dos Abraços; tradução de Eric Nepomuceno)



(Ilustração:  Zdzisaw Beksisk)




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