quarta-feira, 6 de julho de 2011

O DRAMA DO CRONISTA, de José Carlos Sibila Barbosa





Meu querido leitor. Hoje vou lhe falar francamente. Com menos franqueza do que o Braga. Conforme fiquei sabendo, em 1934 ele escreveu uma crônica, mandando vocês todos para aquele lugar. Pelo jeito ninguém foi, ou se foi, voltou, pois vocês continuam aí, todos os dias, esperando que eu possa modificar a inutilidade dos seus dias. Eu não vou ser tão competente como o Braga na arte de falar a verdade, nem mesmo tenho a sua letra. Mas nesta tarde de imenso calor, eu ter que ficar aqui preso, só para que no dia seguinte você tenha o que ler é judiar demais deste cronista que não ganha para ser sodomizado.

Mas quem sou eu para ser ele? Não posso perder o meu emprego, justamente agora que assinei com cachaça um contrato de financiamento para aquisição da casa própria. É certo que depois de ter assinado, prometi que jamais beberia em toda a minha vida. Mas besteira feita, a ressaca não cura e eu vou ter que escrever para vocês para poder pagar mais ou menos em dia o meu financiamento. 

O calor e a má vontade não me deixam pensar. Vou ver se eu me aproprio ( apropriar no lugar de roubar é Malufistamente chique) de algum texto de alguém. 

-“Ligia... Ligia... pode me emprestar algumas falas para encher o espaço? Ligia, vem cá”. Mas que falta de companheirismo. 

- “Pablito...Neruda, você quem sabe...? Não? Mas você não disse ao carteiro que a poesia não é de quem escreve...É de quem precisa? Eu preciso, Pablo. Já imaginou a cara do meu leitor se amanhã a página estiver em branco? Me ajude a escrever ao menos uma frase. 

-“Glauber, você, você não vai me negar. Uma imagem pelo menos...Que importa se é de Deus ou do Diabo? Glauber, vem cá”. 

Olha meu leitor, tentei muita gente, só de Andrade foram três, mas ninguém quis saber de me ajudar não. Acho que também estão com o saco cheio de vocês, ou então são muito egoístas, sei lá. Porque vocês não vão perguntar para eles e aproveitam para ficar por lá junto deles, ou pelo menos da maioria? 

Ah! Aquele ali eu sei que me empresta uma frase. Se ele não me emprestar eu roubo, que ele não vai reclamar. Vou usar a frase dele para que o meu querido leitor jamais se esqueça do autor, que na falta do que fazer dizia “Estupre, mas não mate”. Mas para que serve esta frase? Não vale nada não. Acho que vou deixar para escrever outro dia. 

Até a próxima. 



(Ilustração: Antônio Bandeira)





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