sexta-feira, 26 de dezembro de 2025
O BILHETE DO VIZINHO DO FBI, Miranda July
terça-feira, 23 de dezembro de 2025
CANCIÓN DEL ESPOSO A SU AMADA /CANÇÃO DO ESPOSO PARA A AMADA, de Eunice Odio
1.
Asomada a mi pecho
Tatuada en él como la edad
y el daño.
Como una suave grey de colinas
cuyo rumbo retorna con el alba,
Habla mi amada
con su amor que tiene
apenas pecho diurno y voz descalza.
A mi sombra
se bordearon de pulpa sus caderas.
Por mí arrea con sus pechos
el ganado del alba,
Y la tarde a su paso se quebranta,
como de junco herido
y laurel entornado.
Párpados transitados
de nieve y mediodía,
Pozo donde mi boca
desmedida resbala
como torrente de paloma
y sal humedecida.
– Sobre los muslos te pusieron
racimos de ira y vocación de besos.
Yo haré que de tus muslos
bajen manojos de agua,
y entrecortada espuma,
y rebaños secretos.
Ven,
Amada.
Los árboles
todos tienen tu cándida estatura,
y tu párpado caído,
y tu gesto mojado,
Edificio de alondras
habitado de climas
donde legisla el sol
sobre viñedos de oro.
A tu sombra
me encontrarán los pájaros salvajes.
Tu voz de aire caído
entre cuatro azucenas,
desfilará en mi oído
como acude la tarde.
Ven,
te probaré con alegría.
Tú soñarás conmigo
esta noche.
Tradução
de Luiza Nilo Nunes:
Caída no meu peito
Tatuada no meu peito como a idade
e o desastre.
Como uma frágil irmandade de colinas
norteadas pela manhã,
Fala a minha amada
com seu amor que mal
tem peito diurno e voz descalça.
À minha sombra
as suas ancas rodearam-se de pomos.
Para mim ela aparelha com seus seios
o gado da manhã,
E quebra-se o poente à sua passagem,
como de junco ferido
e loureiro derrubado.
Pálpebras transitadas
de neve e meio-dia,
Tanque onde se afoga
a minha boca profunda
como correntes de pombas
e sal humedecido.
– Sobre as coxas puseram-te
cachos de cólera e vocação de beijos.
De tuas coxas farei
descer cardumes de água,
e espuma interrompida,
e secretos rebanhos.
Vem,
Amada.
Todas as árvores
têm tua cândida altura,
e tua pálpebra descida,
e teu gesto molhado,
Prédio de cotovias
habitado por febres
onde ministra o sol
sobre vinhedos de ouro.
À tua sombra
hão de encontrar-me os pássaros selvagens.
Tua voz de melancólico sopro
entre quatro açucenas,
soará em meus ouvidos
como o chamado da tarde.
Vem,
provar-te-ei com alegria.
Tu sonharás comigo
esta noite.
(Os
elementos terrestres e outros poemas, 2020).
(Ilustração: Frida Castelli)
sábado, 20 de dezembro de 2025
PARA AGARRAR OS SONHOS E CAVALGAR O DORSO DOS TIGRES, Marcelo Mirisola
quarta-feira, 17 de dezembro de 2025
FIVE O'CLOCK TEAR, de Emanuel Félix
domingo, 14 de dezembro de 2025
LER, de Cesare Pavese
É verdade que não devemos nos cansar de conclamar os
escritores à clareza, à simplicidade, à solicitude para com as massas que não
escrevem, mas às vezes se instaura a dúvida de que nem todos saibam ler. Ler é
tão fácil, dizem aqueles cujo hábito de ler acabou com qualquer respeito pela
palavra escrita. Mas quem, pelo contrário, trata de homens ou de coisas mais do
que de livros, e sai pela manhã e volta à noite, endurecido, quando por acaso
ele se recolhe a uma página, dá-se conta de ter sob os olhos algo difícil e
bizarro, esmorecido e ao mesmo tempo forte, que o agride e o encoraja. Seria
inútil dizer que este último está mais perto da verdadeira leitura do que o
outro.
Acontece com os livros assim como com as pessoas. São
levados a sério. Mas justamente por isso devemos nos precaver de torná-los
ídolos, isto é, instrumentos de nossa preguiça. O homem que não vive entre
livros, e que deve fazer um esforço para abri-los, tem um capital de humildade,
de força inconsciente – a única que vale – que lhe permite se aproximar das
palavras com o respeito e a ansiedade com que se aproxima de uma pessoa
querida. E isso vale muito mais do que a “cultura”; isso é, na verdade, a verdadeira
cultura. Necessidade de compreender os outros, caridade para com os outros, que
é afinal o único modo de compreender e amar a nós mesmos: a cultura começa
aqui. Os livros não são os homens, são meios para alcançá-los; quem os ama e
não ama os homens é um presunçoso ou um condenado.
Existe um obstáculo ao ler – e é sempre o mesmo, em todos
os campos da vida –, a excessiva segurança de si, a falta de humildade, a
recusa a acolher o outro, o diferente. Sempre nos fere a inaudita descoberta de
que alguém viu não mais longe do que nós, mas diferentemente de nós. Somos
feitos de hábitos mesquinhos. Amamos nos maravilhar, como crianças, mas não
tanto assim. Quando o estupor nos impele a sair de nós mesmos, a perder o
equilíbrio para reencontrar talvez um outro mais destemido, então enrugamos a
boca, batemos o pé, voltamos realmente a ser criança. Mas das crianças nos
falta a virgindade, que é a inocência. Nós temos ideias, temos gostos, já lemos
livros: possuímos alguma coisa e, como todo possuidor, estremecemos por esta
alguma coisa.
Todos nós, infelizmente, já lemos. E como acontece
frequentemente de os pequenos burgueses se importarem mais com o falso decoro e
os preconceitos de classe do que os ágeis aventureiros do grande mundo, assim o
ignorante que leu alguma coisa se prende cegamente ao gosto, à banalidade, ao
preconceito que o tomou, e a partir de então, se ocorre de ele ainda ler, ele
julga e condena tudo de acordo com tal medida. É muito fácil aceitar a
perspectiva mais banal e se apegar a ela, seguros do consenso da maioria. É
muito cômodo supor que todo esforço já acabou e que se conhece a beleza, a
verdade, a justiça. É cômodo e vil. É como acreditar que se está absolvido do
eterno e temente dever de ter caridade com os homens simplesmente porque de vez
em quando dá uma moeda ao pedinte. Nada faremos, nem mesmo aqui, sem o respeito
e a humildade: a humildade que entreabre frestas em nós através da nossa
substância de orgulho e preguiça, o respeito que nos persuade à dignidade dos
outros, do diferente, do próximo enquanto tal.
Fala-se sobre livros. E sabe-se que livros, quanto mais
ingênua e plana é a sua voz, mais dor e tensão eles custaram a quem os
escreveu. É inútil, portanto, ter esperança de tateá-los sem pagar um preço
pessoal por isso. Ler não é fácil. E acontece, como se costuma dizer, que quem
estudou, quem se move agilmente no mundo do conhecimento e do gosto, quem tem o
tempo e os meios para ler, muito frequentemente acaba sem alma, sem amor pelo
homem, acaba encrostado e endurecido pelo egoísmo de casta. Enquanto quem
aspiraria, como aspira à vida, a este mundo da fantasia e do pensamento, quase
sempre se encontra ainda privado dos elementos iniciais: lhes falta o alfabeto
de alguma linguagem, não lhes sobram nem tempo, nem forças, ou, pior, estão
corrompidos por uma falsa preparação, quase uma propaganda, que lhes barra e
deturpa os valores. Quem encara um tratado de física, um texto de
contabilidade, a gramática de uma língua, sabe que existe uma preparação
específica, um conjunto mínimo de noções indispensáveis para tirar algum
proveito da nova leitura. Quantos se dão conta de que uma bagagem técnica
análoga é necessária para se aproximar de um romance, um poema, um ensaio, uma
reflexão? E, ainda, que essas noções técnicas são incomensuravelmente mais
complexas, sutis e fugidias do que as outras, e não podem ser encontradas em
nenhum manual, em nenhuma bíblia? Todos acham que um conto, um poema, será
naturalmente acessível à atenção humana comum, por falar não ao físico, ao
contabilista ou ao especialista, mas sim ao homem que existe em todos eles. E é
este o erro. Outro é o homem, outros, os homens. No final das contas, é tola a
lenda de que poetas, narradores e filósofos se referem ao homem em absoluto, ao
homem abstrato, ao Homem. Eles falam ao indivíduo de uma determinada época e
situação, ao indivíduo que tem determinados problemas e procura resolvê-los à
sua maneira, inclusive e sobretudo quando lê romances. Será preciso então, para
entender os romances, situar-se em sua época e propor-se os seus problemas; o que
quer dizer, nesse campo, aprender antes de mais nada as linguagens, a
necessidade das linguagens. Convencer-se de que, se um escritor escolhe certas
palavras, certos tons e ares insólitos, ele tem pelo menos o direito de não ser
subitamente condenado em nome de uma leitura precedente, na qual os ares e as
palavras estavam mais organizados, eram mais fáceis ou apenas diferentes. Esse
feito da linguagem é o mais vistoso, mas não o mais urgente. Claro, tudo é
linguagem em um escritor, mas basta ter compreendido isso para se ver em um
mundo mais vivo e complexo, onde a questão de uma palavra, de uma inflexão, de
uma cadência, torna-se de repente um problema de costume, de moralidade. Ou até
mesmo de política.
Isso basta então. A arte, como dizem, é uma coisa séria.
É tão séria quanto a moral e a política. Mas se temos o dever de nos aproximar
dessas duas últimas com uma modéstia que mira a clareza – caridade com os
outros e dureza conosco –, não é possível compreender com que direito, diante
de uma página escrita, nos esquecemos de sermos homens e de que com um homem
estamos falando.
Referência bibliográfica
(Tradução de Cláudia Alves)
(Ilustração : Alfred Stevens 1856 -
jeune fille lisant)
quinta-feira, 11 de dezembro de 2025
KA'BA / KASBAH, de Amiri Baraka(LeRoy Jones)
A closed window looks down
on a dirty courtyard, and Black people
call across or scream across or walk across
defying physics in the stream of their will.
Our world is full of sound
Our world is more lovely than anyone's
tho we suffer, and kill each other
and sometimes fail to walk the air.
We are beautiful people
With African imaginations
full of masks and dances and swelling chants
with African eyes, and noses, and arms
tho we sprawl in gray chains in a place
full of winters, when what we want is sun.
We have been captured,
and we labor to make our getaway, into
the ancient image; into a new
Correspondence with ourselves
and our Black family. We need magic
now we need the spells, to raise up
return, destroy,and create. What will be
the sacred word?
Tradução de Leonardo Morais:
Uma janela fechada baixa o olhar
Até um pátio sujo, e gente negra
Reclama e grita e caminha sempre contra
Desafiando a física com sua vontade.
Nosso mundo está cheio de sons
Nosso mundo é mais encantador que o de qualquer outro
Apesar de sofrermos, de nos matarmos uns aos outros
E às vezes fracassarmos em caminhar no ar.
Somos gente maravilhosa
Com imaginações Africanas
repleta de máscaras e danças e cantos portentosos
com olhos e narizes e braços Africanos
mesmo quando nos aniquilamos em cinzas cadeias
em um lugar cheio de invernos, quando o que desejávamos
era o Sol.
Fomos capturados
e trabalhamos duro para conseguir escapar
até a antiga imagem, até
uma nova correspondência com nós mesmos
e nossa família Negra. Precisamos da magia,
e precisamos dos encantamentos, para surgir,
retornar, destruir e criar. Qual será
a palavra sagrada?
Tradução de Helena Barbas :
Uma janela fechada sobranceira
olha um pátio sujo, e os negros
a cruzar apelos, gritos, atravessam-no
desafiando a física com a torrente da sua vontade
O nosso mundo está cheio de som
O nosso mundo é mais belo que qualquer outro
embora soframos, e nos matemos uns aos outros
e às vezes nos falhe andar no ar
Somos gente bela
com imaginações africanas
cheios de máscaras, danças e cantos empolgantes
com olhos africanos, e narizes, e braços,
que se abrem com grilhões cinzentos num lugar
cheio de Invernos, e só queremos o sol.
Fomos capturados,
irmãos. E labutamos
para ser livres, para transformar
a imagem antiga, numa nova
correspondência connosco próprios
e com a nossa família negra. Precisamos de magia
precisamos agora dos sortilégios, para nos erguermos
regressar, destruir e criar. Qual será
a palavra sagrada?
segunda-feira, 8 de dezembro de 2025
A MORTE DOS GIRASSÓIS, de Caio Fernando Abreu
sexta-feira, 5 de dezembro de 2025
DA FIDELIDADE, de Teresa Balté
ser-te-ei infiel por uma noite
ficas longe e o corpo vibra ainda
chama por outro corpo chama viva
e não por ti amor
nem outro amor
e porque não chamar amor
aos nossos corpos
apenas e supostos todavia
amor que não se cala
grita ou morre
ouve outro amor
não és paixão nem usufruto
consegue ver em mim somente amor
e ficaremos quites
ouve amor
ouve outro amor
o amor reparte-se e divide-se
como a luz ou o dia que se extingue
nada te dou ou tiro nada ofereço
aquilo que não tenhas não é teu
aquilo que não sejas não tem preço
(Poesia Quase Toda, 2005)
(Ilustração: Teresa Balté - sem título, 1986)
terça-feira, 2 de dezembro de 2025
COMO GANHEI O CONCURSO DE QUEM CONTAVA MELHOR UM FILME, de Hernán Rivera Letelier






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