Esconde o oceano em uma lágrima,
acumula navalhas na memória,
em óvulo reparte o nascituro,
cala os apelos da noite, silencia
todas as falas orantes por amor,
apaga-me as lembranças, retira-me
a força de meus braços, sufoca-me
os ais! de gozo, atira-me no abismo,
acumula calvários em meus passos,
embaralha equinócios, desregula
os astros e estações, os hemisférios,
entorna o rio-mar no vão da lua,
emudece o cantar dos encantados,
desvirtua o perdão dos tribunais,
desnatura os semáforos, conflita
o trânsito, embaralha os trilhos,
seca os lábios de preces, degenera
a via-láctea, aparta a unidade
da Santíssima Trindade, cala
o Cântico dos Cânticos, desliga
candelabros no céu, desvaira vídeos,
refaz na aurora a noite, desintegra
o DNA do ser, desassossega
o sono, afasta a mão amiga
e desespera Deus, arranca o sol,
acumula em meu peito as tempestades,
apaga minha sombra, me rumina
em ódio de cruentas profecias,
com sílabas de sabres castra o verso,
retém o curso ávido da vida,
sustém o aracnídeo fio da morte,
faz do Demónio meu Anjo da Guarda,
relega-me vazio no ardil da sorte,
livra meu coração de suas amarras,
desata-me da linha do destino,
quebra os fonemas de mim neste poema,
se eu não morrer de amar de amor amado
se eu não morrer de amor por ti amada.
(Altar em chamas)
(Ilustração: Paul Bond - Manifestations of a lucid dream)
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