quarta-feira, 20 de maio de 2020

MY LAST DUCHESS (FERRARA) / A MINHA ÚLTIMA DUQUESA, de Robert Browning





That’s my last Duchess painted on the wall,

Looking as if she were alive. I call

That piece a wonder, now: Fra Pandolf’s hands

Worked busily a day, and there she stands.

Will’t please you sit and look at her? I said

“Fra Pandolf” by design, for never read

Strangers like you that pictured countenance,

The depth and passion of its earnest glance,

But to myself they turned (since none puts by

The curtain I have drawn for you, but I)

And seemed as they would ask me, if they durst,

How such a glance came there; so, not the first

Are you to turn and ask thus. Sir, ’twas not

Her husband’s presence only, called that spot

Of joy into the Duchess’ cheek: perhaps

Fra Pandolf chanced to say “Her mantle laps

Over my lady’s wrist too much,” or “Paint

Must never hope to reproduce the faint

Half-flush that dies along her throat”: such stuff

Was courtesy, she thought, and cause enough

For calling up that spot of joy. She had

A heart—how shall I say?—too soon made glad,

Too easily impressed; she liked whate’er

She looked on, and her looks went everywhere.

Sir, ’twas all one! My favour at her breast,

The dropping of the daylight in the West,

The bough of cherries some officious fool

Broke in the orchard for her, the white mule

She rode with round the terrace—all and each

Would draw from her alike the approving speech,

Or blush, at least. She thanked men,—good! but thanked

Somehow—I know not how—as if she ranked

My gift of a nine-hundred-years-old name

With anybody’s gift. Who’d stoop to blame

This sort of trifling? Even had you skill

In speech—(which I have not)—to make your will

Quite clear to such an one, and say, “Just this

Or that in you disgusts me; here you miss,

Or there exceed the mark”—and if she let

Herself be lessoned so, nor plainly set

Her wits to yours, forsooth, and made excuse,

—E’en then would be some stooping; and I choose

Never to stoop. Oh sir, she smiled, no doubt,

Whene’er I passed her; but who passed without

Much the same smile? This grew; I gave commands;

Then all smiles stopped together. There she stands

As if alive. Will’t please you rise? We’ll meet

The company below, then. I repeat,

The Count your master’s known munificence

Is ample warrant that no just pretence

Of mine for dowry will be disallowed;

Though his fair daughter’s self, as I avowed

At starting, is my object. Nay, we’ll go

Together down, sir. Notice Neptune, though,

Taming a sea-horse, thought a rarity,

Which Claus of Innsbruck cast in bronze for me!



Tradução de João Almeida Flor:




Aquela é a minha última Duquesa pintada na parede,

parece mesmo que está viva. Agora considero

aquela peça um encanto; as mãos de Fra Pandolfo

trabalharam um dia diligentes e ali está ela.

Não quer sentar-se a contemplá-la? Eu disse

Fra Pandolfo de propósito, pois nunca

estranhos como o senhor fitaram aquele semblante

com a profundidade e a paixão do seu olhar sincero

que não se voltassem para mim (pois ninguém corre

a cortina que abri para o senhor ver, a não ser eu)

parecendo perguntar-me, se a tanto ousassem,

como é que um olhar assim ali se oculta; por isso não é

o senhor o primeiro a voltar-se e a perguntar. Não foi, senhor,

só a presença do marido que deu aquele esplendor

às faces da Duquesa. É provável que

Fra Pandolfo tivesse dito por acaso «Esse manto

encobre demasiado o vosso pulso, senhora» ou «As tintas

nunca podem imitar o suave rubor

que se esbate ao longo do pescoço» – coisas assim

eram favores, pensava ela, e motivo bastante

para despertar aquele rubor de alegria. Ela tinha

um coração – como direi? – que depressa exultava

impressionável facilmente; ela gostava de tudo

quanto via e o seu olhar tudo alcançava.

Senhor, tudo era igual! Os meus favores no seu regaço,

a luz do dia declinando no poente,

o ramo de cerejeira que um louco solícito

apanhava no pomar, e a mula branca

que ela montava à volta do terraço – tudo e cada coisa

lhe merecia as mesmas palavras satisfeitas

ou um rubor ao menos. Ela agradecia às pessoas – bom! mas

de um modo – não sei bem como – como se atribuísse

à dádiva do meu nome quase milenário

o mesmo valor de qualquer outra coisa. Quem iria censurar

coisas sem importância como estas? Mesmo se tivesse jeito

para falar (e não tenho) explicando claramente

o que se espera de uma pessoa assim e dissesse «É isto

ou aquilo que em ti me desagrada; aqui pecas por defeito

além por excesso» e se ela se deixasse ensinar

deste modo sem frontalmente

opor sua vontade, pedindo até desculpa,

mesmo assim seria humilhante. E eu não quero nunca

humilhar-me. Oh senhor ela sorria sem dúvida

quando eu passava à sua beira mas a quem

não concedia ela igual sorriso? A coisa tomou vulto. Dei ordens.

Sumiram-se os sorrisos. Ali está ela

como se estivesse viva. Não quer levantar-se. Vamos

ao encontro das pessoas lá a baixo. Repito:

a conhecida generosidade do Conde, vosso amo,

é garantia de serem satisfeitas minhas justas pretensões

em matéria de dote.

Embora, como disse a princípio, o meu interesse

seja a filha dele que é linda. Não. Desceremos,

senhor, os dois juntos. Mas repare naquele Neptuno

domando um cavalo marinho (uma raridade, dizem)

que eu, a Claus de Innsbruck, mandei fundir em bronze.



Tradução de Décio Pignatari:




Ali está a minha última duquesa

Na parede. Parece viva. Que beleza

De obra! Fra Pandolfo não poupou esforço

E ei-la de corpo inteiro, não em busto ou torso.

Você não quer sentar-se para ver melhor?

Não por acaso mencionei o seu pintor,

Pois não costumo a estranhos olhos desvelar

A profundeza da paixão que há nesse olhar,

Que só a mim é dirigido (pois só eu

Abro a cortina), mas eu sinto, percebeu?,

Que quem a vê logo se indaga: de onde veio

Esse olhar? Com você, meu caro, não receio,

É a mesma coisa. Pois eu digo: simplesmente,

A presença do esposo é pouco para a mente

Que procura a razão daquela mancha rosa

De prazer no seu rosto. Uma frase ociosa,

Talvez, de Fra Pandolfo. “Eu acho que o seu manto

Cobre demais o seu pulso”, ou: “Não pode tanto

A arte, não, reproduzir não pode o leve

Rubor em sua garganta, a ir e vir tão breve”.

Galanteria cortês, não mais – o suficiente

Para fazer brilhar um rosto, de repente.

Tinha um jeito, a duquesa, um coração aberto

Ao gostar… ao olhar… Contentamento certo,

O dela; incerto, o meu… Ela não distinguia

Entre gozar das graças que eu lhe concedia,

O declínio da luz ao sol poente, o ramo

De cerejas que um bobo serviçal do amo

Lhe oferecia, a mula branca que montava

Pela terraça, a rir – a tudo ela igualava

Com uma boa palavra, ou um rubor, ao menos.

Que agradecesse, tudo bem – mas é somenos

Equiparar o dom dos novecentos anos

Do meu nome a presentes sem nome? Até planos

De dissuadi-la… Rebaixar-me a isso… O dom

Da palavra me falta… E como, alto e bom som,

Chegar a ela, assim: “Olhe, sua atitude

Me desagrada, passou do ponto, mude”?

Que aceitasse o sermão e até mostrasse medo,

Isto, pra mim, seria ceder, e eu nunca cedo.

Claro, meu caro, de passagem, um sorriso

Ela me dava – mas a quem não dava? Aviso

Não dei, dei ordens: os sorrisos, de imediato,

Murcharam. Mas já pode levantar-se… É fato…

Nesse retrato, agora, ela parece viva…

Podemos ir? Embaixo, a companhia festiva

Nos aguarda. Repito: a generosidade

Do conde, seu senhor, sem dúvida há de

Saber pesar a minha justa pretensão

Ao dote da menina, a cujas graças vão

Os meus melhores sentimentos. De passagem,

Olhe essa peça de escassíssima tiragem:

É um bronze de Netuno domando um delfim,

Que Claus de Innsbruck fez fundir só para mim.



(Ilustração: Agnolo Bronzino - ritratto di Lucrezia de Medici)




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