quinta-feira, 14 de março de 2019

NA TORRE, de Adolfo Bioy Casares










Para esquecer miss Hinton (para esquecer o inesquecível), o velho poeta irlandês deixou a Inglaterra. Na impávida luz do camarote, no Byzantium, pensou a noite inteira na mulher amada: ela gostava bem pouco dele; nem sequer o conhecia seriamente; nem sequer tinha lido seus livros. De manhã desembarcou em Dublin. "Acaso a procurei devidamente?", refletiu. "Acaso a encontrei?" No solitário trem, continuou a pensar: "Ninguém é um só. Sem dúvida nela existe a moça que está destinada a mim e que não encontrarei nesta vida". Depois o lago apareceu sob uma chuva tênue e opaca, e sobre a cabeça do poeta voaram trinta e sete cisnes. Bem avançado o dia, chegou à porta da torre. Um raio de sol, como uma pálida espada, atravessou as nuvens e ensaiou uma espécie de anacrônico amanhecer. A caseira lhe entregou um telegrama. O poeta o leu, deixou-o cair e, sem responder às perguntas da velha, abriu a porta e subiu correndo a interminável escada de caracol, e muitas vezes pensou que ia desfalecer. Com a vista enevoada, extenuado, enlevado, chegou ao topo da torre, onde miss Hinton o esperava tomando chá, no jardim de sua casa, em Westmorland, e também correndo descalça na areia, em uma tarde de outono, contra um céu de furiosas gaivotas, e cozinhando, na casa de umas amigas, o célebre Plum Pudding Hinton (receita de sua avó paterna), e dançando, encantadoramente fantasiada de lavadeira, em uma festa beneficente, e lendo risonhamente com sua amiga miss Farr um poema que ele lhe dedicara, e guardando (sozinha, horas depois), em um cofre de palha com forro de seda violeta, esse mesmo poema, e soprando bolhas de sabão, e fazendo exercícios respiratórios, e expirando e sorrindo, na companhia do piloto norte-americano Peter de Paola, ao volante de um automóvel, para uma fotografia publicitária, e tossindo, congestionada pelo esforço de nascer, e dando, ao filho da governanta, sua primeira laranjada com óleo de rícino, e assistindo, com um grupo de jovens da sociedade, à primeira exposição londrina de arte cubista, e jazendo em seu ataúde, e recebendo o segundo prêmio de "deck-tennis", a bordo do Berengaria, e gritando apavorada, na rua, de noite, enquanto um letreiro luminoso anunciava: "Florio's Café", e caminhando por uma alameda em Westmorland. A caseira recolheu o papel, que um golpe de vento carregara até o maciço de agapantos. Leu: "Lamentamos informar que Barbara Hinton morreu ontem à noite". 





(Obra Completa de Adolfo Bioy Casares; trad. De Sérgio Molina) 



(Ilustração: Paul Delvaux - the sleeping Venus-1944)







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