quarta-feira, 1 de agosto de 2018

NOCTURNO EN QUE NADA SE OYE / NOTURNO EM QUE NADA SE OUVE, de Xavier Villaurrutia







En medio de un silencio desierto como la calle antes del crimen

sin respirar siquiera para que nada turbe mi muerte

en esta soledad sin paredes

al tiempo que huyeron los ángulos

en la tumba del lecho dejo mi estatua sin sangre

para salir en un momento tan lento

en un interminable descenso

sin brazos que tender

sin dedos para alcanzar la escala que cae de un piano

invisible

sin más que una mirada y una voz

que no recuerdan haber salido de ojos y labios

¿qué son labios? ¿qué son miradas que son labios?

y mi voz ya no es mía

dentro del agua que no moja

dentro del aire de vidrio

dentro del fuego lívido que corta como el grito

Y en el juego angustioso de un espejo frente a otro

cae mi voz

y mi voz que madura

y mi voz quemadura

y mi bosque madura

y mi voz quema dura

como el hielo de vidrio

como el grito de hielo

aquí en el caracol de la oreja

el latido de un mar en el que no sé nada

en el que no se nada

porque he dejado pies y brazos en la orilla

siento caer fuera de mí la red de mis nervios

mas huye todo como el pez que se da cuenta

hasta ciento en el pulso de mis sienes

muda telegrafía a la que nadie responde

porque el sueño y la muerte nada tienen ya que decirse.



Tradução de Jorge Pieiro:


Em meio a um silêncio deserto como a rua antes do crime

sem respirar sequer para que nada turve minha morte

nesta solidão sem paredes

ao tempo em que fugiram os ângulos

no túmulo do leito deixo minha estátua sem sangue

para sair em um momento tão lento

em uma interminável queda

sem braços para estender

sem dedos para alcançar a nota que cai de um piano invisível

sem mais que uma olhada e uma voz

que não recordam ter saído de olhos e lábios

que são lábios? que são olhadas que são lábios?

e minha voz já não é minha

dentro da água que não molha

dentro do ar de vidro

dentro do fogo lívido que corta como o grito

E no jogo angustioso de um espelho defronte a outro

cai minha voz

e minha voz que madura

e minha voz queimadura

e meu bosque maduro

e minha voz queima dura

como o gelo de vidro

como o grito de gelo

aqui no caracol da orelha

o latido de um mar no qual não sei nada

no qual não sei nada

porque tem deixado pés e braços na margem

sinto cair fora de mim a rede de meus nervos

mas foge tudo como o peixe que se dá conta

até cem no pulso de minhas têmporas

muda telegrafia a que ninguém responde

porque o sonho e a morte nada têm já que se dizer.



Tradução de Ricardo Domeneck:


Em meio a um silêncio deserto como a rua antes do crime

sem sequer respirar para que nada turve minha morte

nesta solidão sem paredes

no momento em que fugiram os ângulos

na tumba do leito deixo minha estátua sem sangue

para sair em um instante tão lento

em uma descida interminável

sem braços para estender

sem dedos para alcançar a escala que cai de um piano invisível

sem nada mais que um olhar e uma voz

que não se lembram de ter saído de olhos e lábios

o que são lábios? que são olhares que são lábios?

E minha voz já não é minha

dentro da água que não molha

dentro do ar de vidro

dentro do fogo pálido que corta como o grito

E no jogo angustiante de um espelho perante outro

cai minha voz

e minha voz que madura

e minha voz queimadura

e minha foz que matura

e minha voz queima dura

como o gelo de vidro

como o grito de gelo

aqui no caracol da orelha

no latido de um mar no qual não sei nada

no qual não sei nada

porque deixei pés e braços na areia

sinto cair fora de mim a rede dos meus nervos

mas tudo foge como o peixe que se dá conta

até cem no pulso das minhas têmporas

telegrafia muda à qual ninguém responde

porque o sonho e a morte já nada têm a se dizerem




(Ilustração: Edvard Munch – melancolia)







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