quarta-feira, 25 de outubro de 2017

EFEITO BORBOLETA: A LÓGICA DA TEORIA DO CAOS, de Marcelo Lopes Vieira


  




"Como se o bater das asas de uma borboleta na Ásia,
provocasse, meses depois, um tornado na América”.

Edward Lorenz, 1961.




A citação de Edward Lorenz, que abre nosso texto, talvez, seja tão conhecida quanto incompreendida. Seu sentido literal soa descabido e sem sentido lógico em vista da miríade de eventos, variáveis e fatores, que estão entre estas duas ocorrências tão inversamente proporcionais.

Todavia, quando Lorenz proferiu esta ideia, seu objetivo era elucidar interpretações técnicas por meio de uma alegoria didática. O mesmo que fizeram Ray Bradbury, em seu conto “O Som do Trovão”, e Stephen King, no livro “Novembro de 63” – neste último caso, embutindo uma série de questões filosóficas e entrelaçando outras teorias científicas, ou inerente a ficções científicas se assim o preferir – no meio literário.

Na história de Bradbury, a empresa Safári do Tempo, S.A. vendia aventuras no passado, onde você podia caçar qualquer tipo de animal, em qualquer era. Claro que alguns cuidados deveriam ser tomados:

  1. os aventureiros só poderiam caminhar numa plataforma suspensa a quinze centímetros do chão; 
  2. não podiam tocar em nada e; 
  3. muito menos, matar um animal sem a permissão do guia. 

Intrigado com as condições, o protagonista questiona o motivo de tais orientações. “Não queremos mudar o futuro” é a resposta que ele obtém.

No desenrolar da trama, nosso protagonista pisa num graveto e o quebra, mudando o resultado de uma eleição para presidente que ele havia ganho em seu tempo presente. Ou seja, um simples graveto fora do lugar, criou uma cadeia de eventos caótica que se tornava, como uma avalanche, cada vez maior, culminando em um evento grandioso com o passar do tempo.

Alegoricamente, a narrativa de Bradbury possui a mesma ideia central da frase de Lorenz, todavia, o matemático norte-americano usou sua concretização didática como forma de explicar a alteração que obteve em suas simulações climáticas.

Talvez, se interpretado cientificamente, a alegoria de Bradbury nos renderia o “efeito Bradbury“, ou o “efeito Safári do Tempo“. Mas concordo, o termo “efeito borboleta” é mais marcante, tanto pela beleza implícita, quanto pela curiosidade que incita, além de casar perfeitamente com a formulação científica.

Os fatos que a história nos apresenta dão conta de um matemático, meteorologista e filósofo, Edward Lorenz, que reprogramou um modelo de simulação de movimentos de ventos e massas de ar, nos primitivos computadores da época.

Naqueles dias, a computação quase rupestre limitava a precisão e as equações precisavam ser simplificadas. Nesta repetição de seu experimento, Lorenz digitou algumas casas decimais a menos, dando uma pequena e, a priori, desimportante perturbação nas condições iniciais do problema.

A crença do pesquisador era de que o resultado se alteraria pouco, mas seu espanto foi total quando se viu completamente contrariado pelo comportamento caótico e imprevisível de seu sistema, mesmo sendo ele simples aos olhos da matemática.

E como alguns grandes nomes da ciência antes de si, proferiu sua frase marcante (que abre o nosso texto) ao tentar exemplificar a condição de sua simulação.

Logo, este fenômeno observado por Lorenz seria gravado no imaginário popular como “efeito borboleta” e abarcaria, para os leigos, todo o conhecimento ainda em desenvolvimento sob o rótulo de Teoria do Caos. Físicos, químicos, astrônomos e matemáticos estão mostrando, nas mais diferentes áreas, a incidência do efeito borboleta nas mais diversas áreas do cotidiano, a saber: bolsa de valores, trânsito, movimento de partículas, história, biologia, crescimento populacional etc.

Ou seja, Bradbury estava certo quando supôs em seu conto que “a modificação de um pequeno acontecimento séculos atrás, poderia levar o mundo a outra situação”, tema mais amplamente explorado na já citada obra de Stephen King, “Novembro de 63″.

Dizer que as asas de uma borboleta provocariam um tornado não se torna tão absurdo do ponto de vista matemático, se pudermos garantir variabilidade adequada de eventos e tempo suficientemente grande para o desenrolar de tais eventos.

Mesmo impossível na prática, pela simples impotência em executar previsões para longos períodos de tempo, esse argumento soa muito plausível, matematicamente falando.

Isaac Newton, um dos pais do Cálculo Diferencial, mudou a ciência no século XVIII ao traduzir fenômenos naturais em linguagem matemática, sendo pioneiro na exploração das possibilidades preditivas destes fenômenos, além de nos mostrar que poderíamos explorar o comportamento de todos os fenômenos se tivéssemos informações suficientes.

Sendo assim, às vezes só ainda não possuímos um arcabouço satisfatório de informações para fugir de nossa impotência frente às previsões para longos períodos de tempo.

A semente da Teoria do Caos fora plantada por Henri Poincaré, um dos maiores matemáticos de todos os tempos, em seus estudos em dinâmica conservativa, principalmente em um artigo de 1889, que estudava o Problema Newtoniano de Três Corpos.

Poincaré foi seguido por Birkhoff, já na primeira metade do século XX, que sedimentou o terreno para a exploração da teoria por nomes como Lorenz, o astrofísico Michel Hénon e grandes matemáticos como Stephen Smale, David Ruelle e tantos outros.

Por definição pouco rigorosa, um sistema caótico seria aquele que sofre alterações drásticas em seu resultado quando são feitas mínimas alterações em suas condições iniciais.

Este comportamento caótico está diretamente ligado ao conceito de entropia, que seria, essencialmente, a taxa de dissipação da informação. Esta taxa, por sua vez, pode ser descrita com precisão de diversas maneiras como, por exemplo, o tempo de duplicação (tempo necessário para uma incerteza se duplicar), sendo a questão cabal neste momento, quantos períodos de duplicação são necessários para que este evento altere o todo?

Essa questão é muito pertinente visto que a presença do caos possui um efeito devastador sobre as previsões advindas de modelos científicos, todavia, algumas vezes, o caos controlado pode até ser útil a algumas áreas.

Grosso modo, a Teoria do Caos estuda o comportamento de sistemas dinâmicos não-lineares (traduzindo: várias equações diferenciais complicadas que devem ser solucionadas simultaneamente) que são altamente sensíveis a perturbações em suas condições iniciais.

A natureza determinística (isto é, um modelo matemático que determina os resultados, exatamente, a partir das condições iniciais) do sistema faz dele pouco previsível, sendo este comportamento conhecido como caos determinístico, ou simplesmente caos.

O alicerce matemático desta teoria está alicerçada sobre terreno complexo que envolve teoria qualitativa robusta de equações diferenciais, imersão no mundo da geometria fractal, bem como uma boa capacidade de abstração.

Claro que todos estes elementos são mais do que interessantes (principalmente a este apaixonado pelas equações diferenciais que vos escreve), mas fogem ao escopo da postagem de apenas introduzir, superficialmente, belos conceitos da ciência.

Todavia, saiba que tudo no universo está sob o domínio do Caos, ou é produto do Caos, sendo que James Marti, em 1991, especulou que “o Caos poderia muito bem ser a nova ordem mundial”. Pode não ser bem assim, mas claramente temos uma nova forma de observar e interpretar dados.



(Ilustração: Lisa Stanley - vintage fractal)



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