sábado, 21 de maio de 2011

VOZ DOS ANIMAIS, de Francisca Júlia









O peru, em meio à bulha

De outras aves em concerto,

Como faz de leque aberto?

— Grulha.


Como faz o pinto, em dia

De chuva, quando se interna

Debaixo da asa materna?

— Pia.


Enquanto alegre passeia

Girando em torno do ninho,

Como faz o passarinho?

— Gorjeia.



E de intervalo em intervalo

Quando a manhã se levanta,

No quintal que faz o galo?

— Canta.


Quando a galinha deseja

Chamar os pintos que aninha,

Como é que faz a galinha?

— Cacareja.


A rã quando a noite baixa,

Que faz ela a toda hora

Dentre os limos em que mora?

— Coaxa.


E quando as narinas incha,

Cheio de gosto e regalo,

Como é que faz o cavalo?

— Rincha.


Que faz o gato, que espia

Uma terrina de sopa

Que fumega sobre a copa?

— Mia.


Com a barriga farta e cheia,

Que faz o burrinho quando

Se está na grama espojando?

— Orneia.


Para o sinal de rebate,

Aviso, alarme ou socorro,

Como é que faz o cachorro?

— Late.


Para que as mágoas embale

Quando tresmalha, sozinha,

Que faz a branca ovelhinha?

— Bale.


Em fugir quando porfia

À garra e aos dentes do gato.

Como faz o pobre rato?

— Chia.


De pé a boca descerra

E alta levanta a cabeça,

Que faz a cabra travessa?

— Berra.


Cheia a boca de babuge

Do milho bom que rumina,

Que faz o boi na campina?

— Muge.


A pomba que grãos debulha.

Como faz, batendo as asas

Sobre o telhado das casas?

— Arrulha.


A voz tremida do grilo

Que vive oculto na grama,

A trilar, como se chama?

— Trilo.


Mas escravos das paixões

Que os fazem bons ou ferozes,

Os homens têm suas vozes

Conforme as ocasiões.



(Ilustração: Henri Julien Rousseau – the dream)



Um comentário:

  1. Muito bom esse poema de rimas alternadas e interpoladas.
    Caro professor Isaias,
    admira-me ter poucos interativos comentários nesta sua página tão apurada.
    Abraços poéticos!

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