segunda-feira, 9 de maio de 2011

ODE ON A GRECIAN URN / ODE SOBRE UMA URNA GREGA / ODE A UMA URNA GREGA , de John Keats









I


Thou still unravish’d bride of quietness,

Thou foster-child of silence and slow time,

Sylvan historian, who canst thus express

A flowery tale more sweetly than our rhyme:

What leaf-fring’d legend haunts about thy shape

Of deities or mortals, or of both,

In Tempe or the dales of Arcady?

What men or gods are these? What maidens loth?

What mad pursuit? What struggle to escape?

What pipes and timbrels? What wild ecstasy?




II


Heard melodies are sweet, but those unheard

Are sweeter; therefore, ye soft pipes, play on;

Not to the sensual ear, but, more endear'd,

Pipe to the spirit ditties of no tone:

Fair youth, beneath the trees, thou canst not leave

Thy song, nor ever can those trees be bare;

Bold lover, never, never canst thou kiss

Though winning near the goal — yet, do not grieve;

She cannot fade, though thou hast not thy bliss,

For ever wilt thou love, and she be fair!



III


Ah, happy, happy boughs! that cannot shed

Your leaves, nor ever bid the Spring adieu;

And, happy melodist, unwearied,

For ever piping songs for ever new;

More happy love! more happy, happy love!

For ever warm and still to be enjoy’d,

For ever panting, and for ever young;

All breathing human passion far above,

That leaves a heart high-sorrowful and cloy’d,

A burning forehead, and a parching tongue.


IV


Who are these coming to the sacrifice?

To what green altar, O mysterious priest,

Lead’st thou that heifer lowing at the skies,

And all her silken flanks with garlands drest?

What little town by river or sea shore,

Or mountain-built with peaceful citadel,

Is emptied of this folk, this pious morn?

And, little town, thy streets for evermore

Will silent be; and not a soul to tell

Why thou art desolate, can e’er return.



V


O Attic shape! Fair attitude! with brede

Of marble men and maidens overwrought,

With forest branches and the trodden weed;

Thou, silent form, dost tease us out of thought

As doth eternity: Cold Pastoral!

When old age shall this generation waste,

Thou shalt remain, in midst of other woe

Than ours, a friend to man, to whom thou say’st,

«Beauty is truth, truth beauty,» — that is all

Ye know on earth, and all ye need to know.





Tradução de Augusto de Campos:





I


Inviolada noiva de quietude e paz,

Filha do tempo lento e da muda harmonia,

Silvestre historiadora que em silêncio dás

Uma lição floral mais doce que a poesia:

Que lenda flor-franjada envolve tua imagem

De homens ou divindades, para sempre errantes.

Na Arcádia a percorrer o vale extenso e ermo?

Que deuses ou mortais? Que virgens vacilantes?

Que louca fuga? Que perseguição sem termo?

Que flautas ou tambores? Que êxtase selvagem?



II


A música seduz. Mas ainda é mais cara

Se não se ouve. Dai-nos, flautas, vosso tom;

Não para o ouvido. Dai-nos a canção mais rara,

O supremo saber da música sem som:

Jovem cantor, não há como parar a dança,

A flor não murcha, a árvore não se desnuda;

Amante afoito, se o teu beijo não alcança

A amada meta, não sou eu quem te lamente:

Se não chegas ao fim, ela também não muda,

É sempre jovem e a amarás eternamente.



III


Ah! folhagem feliz que nunca perde a cor

Das folhas e não teme a fuga da estação;

Ah! feliz melodista, pródigo cantor

Capaz de renovar para sempre a canção;

Ah! amor feliz! Mais que feliz! Feliz amante!

Para sempre a querer fruir, em pleno hausto,

Para sempre a estuar de vida palpitante,

Acima da paixão humana e sua lida

Que deixa o coração desconsolado e exausto,

A fronte incendiada e língua ressequida.



IV


Quem são esses chegando para o sacrifício?

Para que verde altar o sacerdote impele

A rês a caminhar para o solene ofício,

De grinalda vestida a cetinosa pele?

Que aldeia à beira-mar ou junto da nascente

Ou no alto da colina foi despovoar

Nesta manhã de sol a piedosa gente?

Ah, pobre aldeia, só silêncio agora existe

Em tuas ruas, e ninguém virá contar

Por que razão estás abandonada e triste.



V


Ática forma! Altivo porte! em tua trama

Homens de mármore e mulheres emolduras

Como galhos de floresta e palmilhada grama:

Tu, forma silenciosa, a mente nos torturas

Tal como a eternidade: Fria Pastoral!

Quando a idade apagar toda a atual grandeza,

Tu ficarás, em meio às dores dos demais,

Amiga, a redizer o dístico imortal:

"A beleza é a verdade, a verdade a beleza"

— É tudo o que há para saber, e nada mais.




(Linguaviagem)




Tradução de Jorge de Sena:




Ó tu, ainda inviolada noiva da quietude,

Por silêncio mantida e pelo tempo imerso,

Silvestre narrador, dotado da virtude

De uma história contar mais doce do que verso,

Que engrinaldada lenda assombra a tua traça

De deuses ou mortais, ou deles confundidos,

Em Tempe ou em de Arcádia os verdejantes prados?

Que homens ou deuses são? Quem virginal perpassa?

Quem perseguindo corre? E quem os perseguidos?

Que tamboris e frautas? Que selvagem graça?



Música ouvida é doce, mas inda mais doce

A não ouvida. Assim, é frautas tão silentes,

Tocais não p’ra os sentidos, mas, como se fosse,

Que ao espírito tocais melodias ausentes!

E entre o arvoredo, ó belo jovem, cantarás

Sempre, e as árvores nunca hão-de aparecer nuas.

Amante audacioso, nunca a beijarás,

Embora quase a beijes – não te dês ao pranto:

Ela não envelhece, embora a não possuas,

Para sempre amarás quem terá sempre encanto.



Felizes ramos, ah, que não podeis perder

As folhas, nem direis à Primavera adeus!

E, ó musico feliz, sempre sem esmorecer

Tocando novos sempre os mesmos ritmos teus!

Oh, mais amor feliz, oh, mais feliz amor!

Ardente para sempre, e ser gozado ainda,

Ansioso para sempre, e sempre juvenil:

E longe, longe o humano e apaixonado ardor

Que deixa o coração numa agonia infinda

E a língua pegajosa, e a testa tão febril!



E para o sacrifício quem aqui vem vindo?

Ó misterioso arúspice, a que verdes aras

A vaca tu conduzes, para os céus mugindo

E nos sedosos flancos tais grinaldas raras?

Que pequena cidade à beira-rio ou mar,

Ou cidadela erguida em escarpa alcantilada,

Desta gente em cortejo esvaziada está?

Cidade: as tuas ruas ora vão ficar

Silentes para sempre. E quem volte não há

Para dizer porquê tu foste abandonada.



Ó Ático contorto! Ó elegância! Ó excesso

De homens marmóreos tantos e donzelas castas,

Como de tantos ramos! Ó joia sem preço!

Tu, forma silenciosa, do pensar afastas

Tal como a eternidade: Pastoral gelada!

Quando esta geração no tempo se perder,

Hás-de sobreviver, entre outros infelizes

Que não já nós, amiga do Homem, a quem dizes:

“O Belo é o Vero, o Vero é o Belo”, eis que mais nada

Na terra vós sabeis ou precisais saber.






Tradução de António Simões:



Tu, noiva inviolada da quietude, filha

Adoptiva do silêncio e dias vagarosos,

Rústica historiadora que nos maravilha

Com um conto florido mais doce que os nossos

Versos: que lenda orlada de folhas ‘stá viva

Nessas formas de deuses ou mortais; ou antes

De ambos, nos vales de Arcádia ou em Tempe?

Que homens são, deuses, donzelas relutantes?

Que perseguição furiosa e tentativa

De escapar? Que adufes, flautas, êxtase ardente?



A música ouvida é doce, a não ouvida

Mais doce é; assim, flautas, continuai,

Não pròs ouvidos, mas prà alma agradecida,

Prò silente canto do espírito, tocai.

Jovens sobre as árvores, tua cantilena

Não vai cessar, as árvores não ficam nuas;

Nunca, nunca darás teu beijo, Amante ousado,

Embora estejas próximo; não tenhas pena:

Ela não envelhece; mesmo desditado,

Bela para sempre, a amá-la continuas.



Ah, felizes ramos, nunca vos cairão

Folhas, de Primavera não vos despedis;

Incansável tocador, como seis feliz,

Tocando sempre, e sempre nova a canção;

Amor, mais feliz, mais feliz, feliz amor!

Sempre ardente e eternamente apreciado,

Sempre anelante e que sempre jovem fica;

À simples paixão humana és superior,

À que deixa um coração triste e saciado,

Uma testa escaldante, uma língua seca.



Quem são estes que vão para o sacrifício?

Mist’rioso sacerdote, pra que verdes aras

Vai a novilha que muge pro infinito,

Com seus flancos macios cheios de grinaldas?

Que cidadezinha junto de rio ou costa

Ou montanha, com cidadela sossegada

Nesta pia manhã, ficou sem sua gente?

E, pequena cidade, as ruas para sempre

Estarão silenciosas e ninguém volta

Pra contar por que ficaste despovoada.



Ó forma ática de mármore, lavada

De homens, donzelas, num entrelaçamento

De ramos de árvore e erva pisada;

Silente, nos levas além do pensamento,

Como a eternidade: Fria cena pastoril!

Quando da velhice vêm as horas más,

Continuas, entre os que estão a sofrer,

A ser amiga do homem a quem dirás:

“Beleza é verdade e verdade beleza, -

Tudo o que sabes e precisas de saber.”
 



Tradução de Fernando Guimarães:


Tu, noiva inviolada da tranquilidade

alimentada pelo silêncio e por um lento passado,

rústica historiadora que consegues dizer um conto

florido em mais belo que todos os nossos poemas:

cercada de folhagens, que lenda assombra o teu contorno

de deuses ou mortais, ou de ambos, através de Tempe

ou pelos vales da Arcádia? Que donzelas esquivas?

Quer perseguição desesperada e que luta para fugir?

Que flautas e tamboris? Que êxtase impetuoso?



As canções que ouvimos são suaves, mas atraem-nos ainda mais

as que não escutamos; continuai pois, melodiosas flautas,

o vosso ritmo. Não para o ouvido corpóreo: mais íntimas,

entoai para o nosso espírito as canções silenciosas.

Sob uma árvore, formoso adolescente, não podes deter

o teu canto, nem estas árvores perder as suas folhas.

E tu, amante ousado, nunca conseguirás dar o teu beijo

ainda que permaneças sempre tão próximo; mas não sofras,

ela não há-de envelhecer e, apesar de não possuíres a felicidade,

continuarás a amá-la, olhando para sempre a sua formusura.



Felizes, felizes ramos que não conseguem perder

as folhas, nem jamais exprimir a despedida da Primavera;

e tu, músico ditoso e infatigável,

que todos os dias vens tocar canções sempre novas.

Feliz, feliz amor, amor tão venturoso,

para sempre ardente e calmo para que fosse possível

realizar-se; para sempre anelante e juvenil,

assim ficaste além de toda a paixão humana

que deixa um coração saciado e cheio de tristeza,

uma fronte ardente e mais secos os nossos lábios.



Que cortejo é este que caminha para o sacrifício?

A que ara tão verde, misterioso sacerdote,

conduzes este novilho que lança os seus mugidos

para o céu, e tem cobertos de grinaldas os flancos lustrosos?

Que pequena cidade junto dum rio ou na margem do mar,

ou sobre um monte, com a sua tranquila cidadela,

se despovoou, nesta manhã piedosa?

Conservar-se-ão para sempre, pequena cidade, as tuas ruas

silenciosas; e ninguém, que saiba explicar-nos

porque ficaste assim abandonada, poderá regressar.



Ó curva ática, perfeito equilíbrio – friso

de homens e mulheres inscritos no mármore,

com ramagens dum bosque e ervas que os pés calcaram.

Tu, forma do silêncio, que ficas para além do pensamento

como a eternidade; tu, fria pastoral!

Quando a velhice chegar para consumir a nossa geração,

continuarás a ser, cercada por outras angústias,

a companheira do homem a quem hás-de dizer:

«A beleza é verdade, verdade é beleza.» Apenas isto

é tudo o que sabes e precisas de saber na terra.


(Ilustração: Riccardo Mantovani)



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