quarta-feira, 27 de abril de 2011

BALLADE DES PENDUS/BALADA DOS ENFORCADOS, de François Villon







Frères humains qui après nous vivez
N'ayez les cœurs contre nous endurciz,
Car, ce pitié de nous pauvres avez,
Dieu en aura plus tost de vous merciz.
Vous nous voyez ci, attachés cinq, six
Quant de la chair, que trop avons nourrie,
Elle est piéca devorée et pourrie,
Et nous les os, devenons cendre et pouldre.
De nostre mal personne ne s'en rie:
Mais priez Dieu que tous nous veuille absouldre!

Se frères vous clamons, pas n'en devez
Avoir desdain, quoy que fusmes occiz
Par justice. Toutefois, vous savez
Que tous hommes n'ont pas le sens rassiz;
Excusez nous, puis que sommes transsis,
Envers le filz de la Vierge Marie,
Que sa grâce ne soit pour nous tarie,
Nous préservant de l'infernale fouldre
Nous sommes mors, ame ne nous harie;
Mais priez Dieu que tous nous vueille absouldre!

La pluye nous a débuez et lavez,
Et le soleil desséchez et noirciz:
Pies, corbeaulx nous ont les yeulx cavez
Et arraché la barbe et les sourciz.
Jamais nul temps nous ne sommes assis;
Puis ca, puis là, comme le vent varie,
A son plaisir sans cesser nous charie,
Plus becquetez d'oiseaulx que dez à couldre.
Ne soyez donc de nostre confrarie;
Mais priez Dieu que tous nous vueille absouldre!

Prince Jhésus, qui sur tous a maistrie,
Garde qu'Enfer n'ait de nous seigneurie:
A luy n'avons que faire ne que souldre.
Hommes, icy n'a point de mocquerie;
Mais priez Dieu que tous nous vueille absouldre!




Tradução de Augusto de Campos:




Irmãos humanos que ao redor viveis,
Não nos olheis com duro coração,
Pois se aos pobres de nós absolveis
Também a vós Deus vos dará perdão.
Aqui nos vedes presos, cinco, seis:
Quanto era cara viva que comia
Foi devorado e em pouco apodrecia.
Ficamos, cinza e pó, os ossos, sós.
Que de nossa aflição ninguém se ria,
Mas suplicai a Deus por todos nós.

Se dizemos irmãos, vós não deveis
Sentir desprezo, embora condenados
Tenhamos sido em vida. Bem sabeis:
Nem todos têm os sentidos sentados.
Desculpai-nos, que já estamos gelados,
Perante o filho da Virgem Maria.
Que seu favor não nos falte um só dia
Para livrar-nos do inimigo atroz.
Estamos mortos: que ninguém sorria,
Mas suplicai a Deus por todos nós.

A chuva nos lavou e nos desfez
E o sol nos fez negros e ressecados,
Corvos furaram nossos olhos e eis-
Nos de pêlos e cílios despojados,
Paralíticos, nunca mais parados,
Pra cá, pra lá, como o vento varia,
Ao seu talante, sem cessar, levados,
Mais bicados do que um dedal. A vós
Não ofertamos nossa confraria,
Mas suplicai a Deus por todos nós.

Meu príncipe Jesus, que a tudo vês,
Não nos entregues à soberania
Do Inferno, que só ouvimos tua voz.
Homens, aqui não cabe zombaria,
Mas suplicai a Deus por todos nós.





(Ilustração: Pascal Bribas – les pendus)



Um comentário:

  1. "A graça do Senhor Jesus seja com todos". Diz o Apocalípse 22,21.
    Portanto, até mesmo com os covardes que dão cabo as suas "míseras vidas".
    Abs poéticos!

    ResponderExcluir