domingo, 4 de junho de 2017

EINE ART VERLUST / UMA ESPÉCIE DE PERDA, de Ingeborg Bachmann






Gemeinsam benutzt: Jahreszeiten, Bücher und eine Musik.

Die Schlüssel, die Teeschalen, den Brotkorb, Leintücher und ein Bett.

Eine Aussteuer von Worten, von Gesten, mitgebracht, verwendet, verbraucht.

Eine Hausordnung beachtet. Gesagt. Getan. Und immer die Hand gereicht.

In Winter, in ein Wiener Septett und in Sommer habe ich mich verliebt.

In Landkarten, in ein Bergnest, in einen Strand und in ein Bett.

Einen Kult getrieben mit Daten, Versprechen für unkündbar erklärt,

angehimmelt ein Etwas und fromm gewesen vor einem Nichts,

(– der gefalteten Zeitung, der kalten Asche, dem Zettel mit einer Notiz)

furchtlos in der Religion, denn die Kirche war dieses Bett.

Ausdem Seeblick hervor ging meine unerschöpfliche Malerei.

Von dem Balkon herab waren die Völker, meine Nachbarn, zu grüßen.

Am Kaminfeuer, in der Sicherheit, hatte mein Haar seine äußerste Farbe.

Das Klingeln an der Tür war der Alarm für meine Freude.

Nicht dich habe ich verloren,

sondern die Welt.



Tradução de Wagner Mourão Brasil:




Compartilhados: estações do ano, livros, uma música.

As chaves, as chávenas de chá, a cesta de pão, lençóis de linho e uma cama.

Um dote de palavras, gestos, o que foi trazido, usado, consumido.

Uma casa com normas respeitadas. O dito. O feito. E sempre a mão estendida.

Apaixonei-me pelo inverno, por um septeto vienense e pelo verão.

Por um mapa, um ninho na montanha, uma praia, uma cama.

Um culto praticado com datas, promessas irrevogáveis declaradas,

idolatrei um não-sei-quê adorável e devotei-me a um nada,

(– o jornal dobrado, as cinzas frias, o bilhete com um recado),

sem os temores da religião, pois a igreja era esta cama.

Da vista para o lago foi-se a minha inexaurível pintura.

Do balcão cumprimentei as pessoas, meus vizinhos.

Defronte à lareira, em segurança, meu cabelo adquiria a sua cor mais profunda.

O toque da campainha da porta era o alarme para a minha alegria.

Não foi a ti que perdi,

mas ao mundo.




(Nota do tradutor: poema escrito após o fim da relação amorosa da poeta com o escritor austríaco Max Frisch)



Tradução de Judite Berkemeier e João Barrento:




Usámos a dois: estações do ano, livros e uma música.

As chaves, as taças de chá, o cesto do pão, lençóis de linho e uma cama.

Um enxoval de palavras, de gestos, trazidos, utilizados, gastos.

Cumprimos o regulamento de um prédio. Dissemos. Fizemos.

E estendemos sempre a mão.



Apaixonei-me por Invernos, por um septeto vienense e por Verões.

Por mapas, por um ninho de montanha, uma praia e uma cama.

Ritualizei datas, declarei promessas irrevogáveis,

idolatrei o indefinido e senti devoção perante um nada,



(- o jornal dobrado, a cinza fria, o papel com um apontamento)

sem temores religiosos, pois a igreja era esta cama.



De olhar o mar nasceu a minha pintura inesgotável.

Da varanda podia saudar os povos, meus vizinhos.

Ao fogo da lareira, em segurança, o meu cabelo tinha a sua cor mais intensa.

A campainha da porta era o alarme da minha alegria.

Não te perdi a ti,

perdi o mundo.





(Últimos poemas, 1957-1967)






(Ilustração : Javier Arizabalo García)







Nenhum comentário:

Postar um comentário