domingo, 3 de janeiro de 2016

PAISAGEM DE UMA AULA DE FILOSOFIA, de Lupe Cotrim Garaude







Porque a pedra

está fora do tempo

e eu por dentro;

porque a terra se desata,

vegetal,

e a mim falta

esse fôlego verde,

em tênue movimento;

porque entre raiz e folha

o animal salta,

elástico, e desconheço

liberdade tão alta;

porque mineral e vegetal

uma floresta é segredo

aberto ao animal

e em mim se enlaça

pelos cipós do medo

— sei-me de outra espécie.

Em que sou fraco. E antes


de tudo—breve.




Mas nessa extensão tão plena

é que mais compreendo.

Tomo nos meus braços,

intersubjetivamente,

o espaço total, que conduz o infinito.

E são rochas de leões,

marés de outono,

folhas alçando-se no arrojo

dos pássaros, répteis

em curvas de diamante,

montanhas côncavas, murmurando,

florestas em ondas, sobre as águas

as distâncias são formas

—corpo de estrela, impulso de planície,

a morte é apenas uma flor

vermelha, que passa no vento,

o amor se desvenda nas colheitas,

rostos anônimos surgem

dos troncos de cimento,

a solidão é o rosto da humanidade

a terra é voo, o céu se reaproxima,

e em tudo estou presente, simultâneo,

o horizonte a meus pés,

como um riacho doce.




Olhando dentro de mim,

de dentro da natureza,

eu a refaço—e invento a beleza.







(Ilustração: Helen M. Turner)







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