domingo, 12 de janeiro de 2014

PRIMEIRO AMOR, de Leandro Soriano








Um amor cego,

só a saudade enxerga.

Verga o peso do nada,

vê a sombra tornar mais claros

o medo de ser tarde,

o fim de uma obra inacabada.

Alheio ao filtro razão

Meu entendimento brilha no lago.

Vago como a lua reflexa,

distorcida na superfície

pelo movimento profundo

do turvo que há em mim.

Hora de pegar o trem,

não sou estação que me prenda.

Sou bilhete de ida que não está à venda.

Nasci clandestino determinado,

nessa trilha já parti.

Vou como quem volta a enxergar o primeiro amor,

Amor com gosto nostálgico,

Parede sem pintura, quadro sem moldura.

Um amor puro, até me seguro,

desse distante não ter .

Não falo do amor paixão, de rolar pelo chão.

Não falo de amor companhia, que na falta angustia.

Não falo do amor materno, tão parente, tão eterno.

Falo do amor impronunciável,

me atrevo a falar e me calo.

Mais amplo é meu silêncio,

refrescado pelo café

nas tardes despedidas de minha vida.

Santa lida que um dia não quer mais terminar.

Mas esse amor tão sem definição

mora em meu coração

divide o amplo espaço

do tédio que sou e faço.

Somos vizinhos,

sem cumprimentos,

apenas um... “tudo bem?”

E passa incontinente,

parece que nem sente

a menção que faço.

Como se fosse lhe dar um abraço.

E o mundo retorcido guarda semelhança

com o todo que é lembrança

desse amor desconhecido.




(Ilustração: Henry Tuke - bath)






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