sábado, 24 de junho de 2023

TARDE DE INVERNO NO PARQUINHO, de Leïla Slimani

     


Os parquinhos nas tardes de inverno. A garoa varre as folhas mortas. As pedrinhas congeladas grudam nos joelhos das crianças. Nos bancos, nas aleias discretas, cruza-se com aqueles que o mundo não quer mais. Eles fogem de apartamentos exíguos, de salas tristes, de poltronas afundadas pela inatividade e pelo tédio. Preferem tremer ao ar livre, com as costas curvadas, os braços cruzados. Às quatro da tarde, os dias ociosos parecem intermináveis. É no meio da tarde que percebemos o tempo desperdiçado, que nos preocupamos com a noite que vai chegar. Nessa hora, temos vergonha de não servir para nada.

Os parquinhos nas tardes de inverno são assombrados pelos vagabundos, os mendigos, os desempregados e os velhos, os doentes, os errantes, os instáveis. Os que não trabalham, os que não produzem nada. Os que não ganham dinheiro. Na primavera, claro, os amantes voltam, os casais clandestinos encontram um refúgio sob as tílias, nas alcovas floridas, e os turistas fotografam as estátuas. No inverno é outra coisa.

Em torno do escorregador congelado, há babás e seu exército de crianças. Embrulhados em jaquetas acolchoadas que os prendem, os pimpolhos correm como gordas bonecas japonesas, o nariz escorrendo muco, os dedos roxinhos. Assopram fumaça branca e ficam maravilhados. Nos carrinhos, os bebês presos pelos cintos contemplam os mais velhos. Talvez alguns estejam melancólicos, impacientes. Têm pressa, sem dúvida, de poder se aquecer trepando nos brinquedos de madeira. Batem os pés imaginando escapar à vigilância das mulheres que os seguram com uma mão firme ou brutal, gentil ou nervosa. Mulheres com túnicas muçulmanas no inverno glacial.

Há mães também, mães com o olhar vago. Mães que um parto recente mantém à beira do mundo e que, no banco, sentem o peso de seu ventre ainda flácido. Carregam seu corpo de dor e secreções, seu corpo que cheira a leite azedo e sangue. Essa carne que elas carregam e a quem não oferecem nem cuidado nem repouso. Há as mães sorridentes, radiosas, tão raras, que todas as crianças invejam. As que não se despediram nessa manhã, que não os deixaram nos braços de outra. Aquelas que um dia de descanso excepcional levou para lá e que aproveitam aquele banal dia de inverno com um entusiasmo estranho.

Há homens também, mas, mais perto dos bancos do parquinho, mais perto da caixa de areia, mais perto dos pimpolhos, as mulheres fazem uma parede compacta, uma defesa intransponível. Desconfia-se dos homens que se aproximam, daqueles que se interessam por esse mundo de mulheres. Aqueles que sorriem para as crianças, que olham para suas bochechas gordas e suas perninhas, são expulsos. As vovós os deploram: “Todos esses pedófilos que existem hoje em dia! No meu tempo isso não existia”.

Louise não tira os olhos de Mila. A menininha corre do escorregador ao balanço. Não para nunca, não quer dar chance ao frio. Suas luvas estão encharcadas e ela as enxuga, esfregando-as contra seu casaco rosa. Adam dorme no carrinho. Louise o enrolou em uma coberta e acaricia gentilmente a pele de sua nuca, entre o casaco e o gorro de lã. Um sol glacial, de brilho metálico, faz com que ela aperte os olhos.

— Aceita?

Uma jovem sentou a seu lado, com as pernas separadas. Estende uma caixinha onde estão alguns doces de mel. Louise a observa. Ela não tem mais de vinte e cinco anos e sorri de maneira um pouco vulgar. Seus cabelos negros estão sujos e sem pentear, mas supõe-se que ela poderia ser bonita. Atraente, ao menos. Ela tem curvas sensuais, um pouco de barriga e coxas grossas. Mastiga seu doce com a boca aberta e chupa os dedos cobertos de mel fazendo barulho.

— Obrigada. — Louise recusa o doce com um gesto.

— De onde eu venho, sempre oferecemos de comer a desconhecidos. Só aqui vi pessoas comendo sozinhas.

Um menino de uns quatro anos se aproxima da jovem e ela enfia um doce na sua boca. O menininho ri.

— É bom pra você — ela diz. — É nosso segredo, certo? Não conte pra sua mãe.

O menininho se chama Alphonse, e Mila gosta de brincar com ele. Louise vem ao parquinho todo dia e todo dia ela recusa os doces gordurosos que Wafa lhe oferece. Proíbe Mila de comê-los, mas Wafa não se ofende. A jovem é muito tagarela e, no banco, com o quadril colado em Louise, conta sua vida. Fala, sobretudo, de homens.

Wafa lembra uma espécie de grande felino pouco sutil, mas muito hábil. Ela ainda está ilegal e não parece se preocupar com isso. Chegou na França graças a um velho para quem fazia massagens em um hotel suspeito de Casablanca. O homem se apegou a suas mãos, tão macias, depois a sua boca e suas nádegas e, enfim, a todo esse corpo que ela lhe ofereceu, seguindo assim seu instinto e os conselhos da mãe. O velho a levou a Paris, onde vivia em um apartamento miserável e recebia dinheiro do Estado.

— Ele ficou com medo de que eu ficasse grávida e seus filhos me puseram pra fora. Mas o velho bem que queria que eu ficasse.

Frente a Louise e seu silêncio, Wafa fala como quem se confessa a um padre ou à polícia. Ela conta os detalhes de uma vida que nunca será escrita. Depois de sair da casa do velho, foi recolhida por uma moça que a registrou em um site de encontros para jovens muçulmanas imigrantes ilegais. Uma noite, um homem marcou um encontro com ela em um McDonald’s de periferia. O cara achou ela bonita. Deu em cima dela. Até tentou violá-la. Ela conseguiu acalmá-lo. Começaram a falar de dinheiro. Youssef aceitou se casar com ela por vinte mil francos. “Não é caro comprar documentos franceses”, ele explicou.

Ela encontrou esse trabalho, uma sorte, junto a um casal franco-americano. Eles a tratam bem, embora sejam bastante exigentes. Alugaram um quartinho para ela a cem metros de sua casa.

— Eles pagam o aluguel, mas, em troca, eu nunca posso dizer não pra eles. Eu adoro esse menino — ela diz, devorando Alphonse com os olhos.

Louise e Wafa se calam. Um vento glacial varre o parquinho e elas sabem que logo terão que ir.

— Coitadinho. Olhe pra ele, mal consegue se mexer de tanta roupa que pus nele. Mas se ele pega uma friagem, a mãe dele me mata.

Wafa tem medo, às vezes, de envelhecer em um desses parques. De sentir seus joelhos cederem nesses velhos bancos gelados, de não ter mais força nem para erguer uma criança. Alphonse vai crescer. Não vai mais colocar os pés no parquinho em uma tarde fria de inverno. Ele vai para o sol. Vai tirar férias. Talvez um dia até durma em um dos quartos do Grand Hôtel, onde ela massageava os homens. Ele, que ela criou, será atendido por uma de suas irmãs ou primas, no terraço de ladrilhos amarelos e azuis.

— Veja só, tudo volta e se inverte. Sua infância e minha velhice. Minha juventude e sua vida de homem. O destino é perverso como um réptil, ele sempre dá um jeito de empurrar a gente pro lado ruim do caminho.

A chuva cai. É preciso voltar.



(Canção de ninar; tradução Sandra M. Stroparo)



(Ilustração: Camille Pissarro: Le Jardin des Tuileries - effet de neige)

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