sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

NOCHE OSCURA / NOITE ESCURA, de San Juan de la Cruz








Canciones del alma que se goza 

de haber llegado al alto estado de la perfección, 

que es la unión con Dios, 

por el camino de la negación espiritual.





En una noche oscura

con ansias, en amores inflamada,

¡oh dichosa ventura!

salí sin ser notada,

estando ya mi casa sosegada.



A oscuras, y segura,

por la secreta escala disfrazada,

¡Oh dichosa ventura!

a oscuras, y en celada,

estando ya mi casa sosegada.



En la noche dichosa

en secreto, que nadie me veía,

ni yo miraba cosa,

sin otra luz y guía,

sino la que en el corazón ardía.



Aquesta me guiaba

más cierto que la luz del mediodía,

adonde me esperaba

quien yo bien me sabía,

en parte donde nadie parecía.



¡Oh noche que guiaste!

¡Oh noche amable más que la alborada:

oh noche que juntaste

Amado con Amada.

Amada en el Amado transformada!



En mi pecho florido,

que entero para él solo se guardaba,

allí quedó dormido,

y yo le regalaba,

y el ventalle de cedros aire daba.



El aire de la almena,

cuando yo sus cabellos esparcía,

con su mano serena

en mi cuello hería,

y todos mis sentidos suspendía.



Quedeme, y olvideme,

el rostro recliné sobre el Amado,

cesó todo, y dejeme,

dejando mi cuidado

entre las azucenas olvidado.



Tradução de José Bento:



Canções da alma que rejubila 

por ter chegado ao alto estado da perfeição,

que é a união com Deus,

pelo caminho da negação espiritual.







Em uma noite escura,

com ânsias, em amores inflamada,

oh ditosa ventura!,

saí sem ser notada,

estando minha casa sossegada.




Às escuras, segura,

pela secreta escada, disfarçada,

oh ditosa ventura!,

às escuras e emboscada,

estando minha casa sossegada.




Nessa noite ditosa,

secretamente, que ninguém me via,

de nada curiosa,

sem outra luz nem guia

senão a que no coração me ardia.




Só esta me guiava

mais segura que a luz do meio-dia,

aonde me esperava

quem eu já bem sabia,

em parte onde ninguém aparecia.




Oh noite, que guiaste!

Oh noite, amável mais que a alvorada!

Oh noite que juntaste

Amado com amada,

amada em seu Amado transformada!




Em meu peito florido,

que inteiro só para ele se guardava,

ficou adormecido,

e eu o afagava,

e o leque de cedros brisa dava.




A viração da ameia,

enquanto eu seus cabelos espargia,

com sua mão que enleia

o meu colo feria,

e meus sentidos todos suspendia.




Fiquei e olvidei-me,

O rosto reclinei sobre o Amado;

cessou tudo, e deixei-me,

deixando o meu cuidado

por entre as açucenas olvidado.





Tradução de Jorge de Sena:








Em uma Noite escura,

com ânsias em amores inflamada,

ó ditosa ventura!

saí sem ser notada,

estando minha casa sossegada.




A ocultas, e segura,

pela secreta escada, disfarçada,

ó ditosa ventura!,

a ocultas, embuçada,

estando minha casa sossegada.




Em uma Noite ditosa,

tão em segredo que ninguém me via,

nem eu nenhuma cousa,

sem outra luz e guia

senão aquela que em meu seio ardia.




Só ela me guiava

mais certa do que a luz do meio-dia,

aonde me esperava

quem eu mui bem sabia,

em parte onde ninguém aparecia.




Ó Noite que guiaste!,

ó Noite amável mais que a alvorada!,

ó Noite que juntaste

Amado com amada,

amada nesse Amado transformada!




No meu peito florido,

que inteiro para ele se guardava,

quedou adormecido

do prazer que eu lhe dava,

e a brisa no alto cedro suspirava.




Da torre a brisa amena,

quando eu a seus cabelos revolvia,

com fina mão serena

a meu colo feria,

e todos meus sentidos suspendia.




Quedei-me e me olvidei,

e o rosto inclinei sobre o do Amado:

tudo cessou, me dei,

deixando meu cuidado

por entre as açucenas olvidado.




(Poesia de 26 Séculos, Coimbra, 1993)



(Ilustração: Daniel Lezama, le songe de Tepeyac, 2003)






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