sábado, 15 de junho de 2019

CATARINA TO CAMOENS / CATARINA A CAMÕES, de Elizabeth Barrett Browning






I



ON the door you will not enter,

I have gazed too long: adieu!

Hope withdraws her peradventure;

Death is near me, — and not you .

Come, O lover,

Close and cover

These poor eyes, you called, I ween,

" Sweetest eyes were ever seen!"



II



When I heard you sing that burden

In my vernal days and bowers,

Other praises disregarding,

I but hearkened that of yours —

Only saying

In heart-playing,

" Blessed eyes mine eyes have been,

If the sweetest HIS have seen!"



III



But all changes. At this vesper,

Cold the sun shines down the door.

If you stood there, would you whisper

" Love, I love you," as before, —

Death pervading

Now, and shading

Eyes you sang of, that yestreen,

As the sweetest ever seen?



IV



Yes. I think, were you beside them,

Near the bed I die upon,

Though their beauty you denied them,

As you stood there, looking down,

You would truly

Call them duly,

For the love's sake found therein,

" Sweetest eyes were ever seen."



V



And if you looked down upon them,

And if they looked up to you ,

All the light which has forgone them

Would be gathered back anew:

They would truly

Be as duly

Love-transformed to beauty's sheen,

" Sweetest eyes were ever seen."



VI



But, ah me! you only see me,

In your thoughts of loving man,

Smiling soft perhaps and dreamy

Through the wavings of my fan;

And unweeting

Go repeating,

In your reverie serene,

" Sweetest eyes were ever seen — "



VII



While my spirit leans and reaches

From my body still and pale,

Fain to hear what tender speech is

In your love to help my bale.

O my poet,

Come and show it!

Come, latest love, to glean

" Sweetest eyes were ever seen."



VIII



O my poet, O my prophet,

When you praised their sweetness so,

Did you think, in singing of it,

That it might be near to go?

Had you fancies

From their glances,

That the grave would quickly screen

" Sweetest eyes were ever seen"?



IX



No reply. The fountain's warble

In the courtyard sounds alone.

As the water to the marble

So my heart falls with a moan

From love-sighing

To this dying.

Death forerunneth Love to win

" Sweetest eyes were ever seen."



X



Will you come? When I'm departed

Where all sweetnesses are hid,

Where thy voice, my tender-hearted,

Will not lift up either lid.

Cry, O lover,

Love is over!

Cry, beneath the cypress green,

" Sweetest eyes were ever seen!"



XI



When the angelus is ringing,

Near the convent will you walk,

And recall the choral singing

Which brought angels down our talk?

Spirit-shriven

I viewed Heaven,

Till you smiled — " Is earth unclean,

Sweetest eyes were ever seen?"



XII



When beneath the palace-lattice

You ride slow as you have done,

And you see a face there that is

Not the old familiar one, —

Will you oftly

Murmur softly,

" Here ye watched me morn and e'en,

Sweetest eyes were ever seen!"



XIII



When the palace-ladies, sitting

Round your gittern, shall have said,

" Poet, sing those verses written

For the lady who is dead,"

Will you tremble

Yet dissemble, —

Or sing hoarse, with tears between,

" Sweetest eyes were ever seen?"



XIV



" Sweetest eyes!" how sweet in flowings

The repeated cadence is!

Though you sang a hundred poems,

Still the best one would be this.

I can hear it

'Twixt my spirit

And the earth-noise intervene —

" Sweetest eyes were ever seen!"



XV



But the priest waits for the praying,

And the choir are on their knees,

And the soul must pass away in

Strains more solemn-high than these.

Miserere

For the weary!

Oh, no longer for Catrine

" Sweetest eyes were ever seen!"



XVI



Keep my riband, take and keep it,

(I have loosed it from my hair)

Feeling, while you overweep it,

Not alone in your despair,

Since with saintly

Watch unfaintly

Out of heaven shall o'er you lean

" Sweetest eyes were ever seen."



XVII



But — but now — yet unremoved

Up to heaven, they glisten fast;

You may cast away, Beloved,

In your future all my past:

Such old phrases

May be praises

For some fairer bosom-queen —

" Sweetest eyes were ever seen!"



XVIII



Eyes of mine, what are ye doing?

Faithless, faithless, — praised amiss

If a tear be of your showing,

Dropt for any hope of HIS !

Death has boldness

Besides coldness,

If unworthy tears demean

" Sweetest eyes were ever seen."



XIX



I will look out to his future;

I will bless it till it shine.

Should he ever be a suitor

Unto sweeter eyes than mine,



Sunshine gild them,

Angels shield them,

Whatsoever eyes terrene

Be the sweetest HIS have seen!



Tradução de Fernando Pessoa:



I



Para a porta onde não surges nem me vês

Há muito tempo que olho já em vão.

A esperança retira o seu talvez;

Aproxima-se a morte, mas tu não.

Amor, vem

Fechar bem

Estes olhos de que dissestes ao vê-los:

O lindo ser dos vossos olhos belos.



II



Quando te ouvi cantar esse bordão

Nos meus de primavera alegres dias;

Todo alheio louvar tendo por vão

Só dava ouvidos ao que tu dizias

- Dentro em mim

Dizendo assim:

"Ditosos olhos de que disse ao vê-los:

O lindo ser dos vossos olhos belos."



III



Mas tudo muda. Nesta tarde fria

O sol bate na porta sem calor.

Se estivesse aí murmuraria

Como dantes tua voz - "amo-te, amor";

A morte chega

E já cega

Os olhos que ontem eram teus desvelos 

O lindo ser dos vossos olhos belos.



IV



Sim. Creio que se a vê-los te encontrasses

Agora, ao pé do leito em que me fino,

Ainda que a beleza lhes negasses,

Só pelo amor que neles eu defino

Com verdade

E ansiedade

Repetirias, meu amor, ao vê-los:

O lindo ser dos vossos olhos belos.



V



E se neles pusesse teu olhar

E eles pusessem seu olhar no teu,

Toda a luz que começa a lhes faltar

Voltaria de pronto ao lugar seu.

Com verdade

E ansiedade

Dir-se-ia como tu disseste ao vê-los:

O lindo ser dos vossos olhos belos.



VI



Mas - ai de mim! - tu não me vês senão

Nos pensamentos teus de amante ausente,

E sorrindo talvez, sonhando em vão,

Trás o abanar do leque levemente;

E, sem pensar,

Em teu sonhar

Iras talvez dizendo sempre ao vê-los:

O lindo ser dos vossos olhos belos,



VII



Enquanto o meu espírito se debruça

Do meu pálido corpo sucumbido,

Ansioso de saber que falas usa

Teu amor pra meu espírito ferido,

Poeta, vem

Mostrar bem

Que amor trazem aos olhos teus desvelos

- O lindo ser dos vossos olhos belos.



VIII



Ó meu poeta, ó meu profeta, quando

Destes olhos louvaste o lindo ser,

Pensaste acaso, enquanto ias cantando,

Que isso já estava prestes de morrer?

Seus olhares

Deram-te ares

De que breve podias não mais vê-los,

O lindo ser dos vossos olhos belos.



IX



Ninguém responde. Só suave, defronte,

No pátio a fonte canta em solidão,

E como água no mármore da fonte,

Do amor pra a morte cai meu coração.

E é da sorte

Que seja a morte

E não o amor, que ganhe os teus desvelos

- O lindo ser dos vossos olhos belos!



X



E tu nunca virás? Quando eu me for

Onde as doçuras estão escondidas,

E onde a tua voz, ó meu amor,

Não me abrirá as pálpebras descidas,

Dize, amo meu,

"O amor, morreu!"

Sob o cipreste chora os teus desvelos

- O lindo ser dos vossos olhos belos.



XI



Quando o angelus toca à oração,

Não passarás ao pé deste convento,

Lembrando-te, a chorar, do cantochão

Que anjos nos traziam do firmamento?

No ardor meu

Eu via o céu

E tu: "O mundo é vil, ó meus desvelos,

Ao lindo ser dos vossos olhos belos?"



XII



Devagar quando, do palácio ao pé,

Cavalgares, como antes, suave e rente,

E ali vires um rosto que não é

O que vias ali antigamente,

Dirás talvez

"Tanta vez

Me esperaste aqui, ó meus desvelos

Ó lindo ser dos vossos olhos belos!"



XIII



Quando as damas da corte, arfando os peitos,

Te disserem, olhando o gesto teu,

"Canta-nos, poeta, aqueles versos feitos

Àquela linda dama que morreu",

Tremerás?

Calar-te-ás?

Ou cantarás, chorando, os teus desvelos

- O lindo ser dos vossos olhos belos?



XIV



"Lindo ser de olhos belos!" Suaves frases

E deliciosas quando eu as repito!

Cem poesias outras que cantasses,

Sempre nesta a melhor terias dito.

Sinto-a calma

Entre a minha alma

E os rumores da terra ? pesadelos:

- O lindo ser dos vossos olhos belos.



XV



Mas reza o padre junto à minha face,

E o coro está de joelhos todo em prece,

E é forçoso que a alma minha passe

Entre cantos de dor, e não como esse.

Miserere

P'los que fere

O mundo, e pra Natércia, os teus desvelos

- O lindo ser dos vossos olhos belos.



XVI



Guarda esta fita que te mando

(Tirei-a dos cabelos para ti).

Sentir-te-ás, quando o teu choro arda,

Acompanhado na tua dor por mi;

Pois com pura

Alma imperjura

Sempre do céu te olharão teus desvelos

- O lindo ser dos vossos olhos belos.



XVII



Mas agora, esta terra inda os prendendo,

Desses olhos o brilho é inda alado...

Amor, tu poderás encher, querendo,

Teu futuro de todo o meu passado,

E tornar

A cantar

A outra dama ideal dos teus desvelos:

O lindo ser dos vossos olhos belos.



XVIII



Mas que fazeis, meus olhos, ó perjuros!

Perjuros ao louvor que ele vos deu,

Se esta hora mesmo vos não mostrais puros

De lágrima que acaso vos encheu?

Será forte

Choro ou morte

Se indignos os tornar de teus desvelos

- O lindo ser dos vossos olhos belos.



XIX



Seu futuro encherá meu spírito alado

No céu, e abençoá-lo-ei dos céus.

Se ele vier a ser enamorado

De olhos mais belos do que os olhos meus,

O céu os proteja,

Suave lhes seja

E possa ele dizer, sincero, ao vê-los:

O lindo ser dos vossos olhos belos.



(Fernando Pessoa Obra Poética)


(Ilustração: Nuno Goncalves - paineis de São Vicente de Fora)




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