Gosto de ouvir uma sanfona bem tocada...
Nem negros estradeiros na pinga, nem capinas, nem apanhas de café,
nem o chiar tristonho dos carros de bois descendo a encosta,
nem cantigas dolentes
de negras que lavam
nas lajes do rio.
Nem barulho, nem ruído. É o jogo de malha na estrada limpinha
sem perigo de Fordes, e o buso, e a bisca, e o marimbo no alpendre,
com o administrador da fazenda;
e o café lavadinho secando no terreiro - que é um gosto se vê,
e o latir brabo dos cachorros caseiros, dos cachorros que latem
quando passam estrangeiros à beira da estrada.
Nem o "eia" imperativo dos carreiros peitudos carreando,
nem jardins, nem cinema, nem o rádio fanhoso da gente da cidade...
Mas a sanfona dolente que enche de desejo o sangue dos mulatos,
mas o vento musgueiro dos arrozais loiros, cacheando,
mas a visita das moças da cidade, moças esganadas por frutas,
moças que linham com a gente só por causa de mexericas graúdas...
Este é o meu domingo.
Domingo mineiro, domingo bom, domingo da fazenda
onde passei minha infância...
Nem trabalho, nem ruídos, nem o tinir das lampianas,
nem o aboio triste dos vaqueiros, nem tocaias, nem brigas,
nem capoeiradas, nem nada...
Mas a alegria e o descanso das obrigações cumpridas
e o riso-criança da satisfação das coisas...
(Revista Verde, Cataguases, 1927)
(Ilustração: Bernadeth Rocha - varanda na roça)
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