quarta-feira, 18 de dezembro de 2024

SWATCH, de Catarina Lins

 

 


O relógio Swatch que eu levava no pulso, quando criança, no pátio

de um navio, talvez, no Chile, segurando os cabelos com uma das mãos, para a fotografia.

Os mesmos cabelos e o relógio que eu vejo agora, na volta de levar o lixo, antes de ligar para a faxina,

antes de ver as mensagens e fazer a lista para o Casamento.

Agora,

outros cabelos adentram a sala sem que ninguém perceba, trazidos pelo vento ou na cabeça de alguém

ainda muito mais jovem

(mas ainda assim, com mesma idade, mais ou menos) –

A melhor brincadeira

era a de índio

todos nas nossas cabanas

feitas de plástico

com arcos e flechas

de plástico.

Eu gostava de ti porque eras

ou parecias, em parte,

incapaz de machucar

alguém

(teoricamente)

incapaz

de machucar.

Mas todas as pessoas ou coisas que parecem incapazes

são assim apenas

na superfície,

na fotografia.

Anos depois, eu olharia

diferente para essa aparência

inofensiva.

 

(Ilustração : Pablo Picasso: Femme à la montre, 1932)

 

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