1.
No meu olhar o recorte
da sua figura – sinal:
o afiado gume do corpo
e da linha que o desenha
lento, em cada tempo
do movimento, sinto
em cada vento, tênue
o móbile de sua presença.
2.
E cheiro em cheio a soma
do suor do sal, do açúcar
desse perfume que acentua
a imagem nua na lembrança
e sigo o rumo do aroma
que respiro na escura
câmara dos sentidos
onde procuro sua fuga
3.
quando, garra, minha mão
apalpa o chão do nada
ou os muros de pele
do corpo que persigo?
Sob a teia do meu tato
sob a veia do meu pulso
sob o impulso da memória
seguro areia ou figura?
4.
E mordo, mastigo e chupo
do centro do cerne da carne
do seu avesso onde mergulho
e bebo o beijo e o gosto
íntimo, nítido, e último
do imo da alma do âmago
do corpo que se desmancha
no espaço da minha boca.
5.
E escapa: mancha de som
esparso na qual o ouvido
capta o espasmo, o passo
da vida, a letra da voz
que se inscreve no sulco
no resgate do sangue: degrau
sob os panos e sob os sustos
do sono escuto seu nome.
(De corpo presente)
(Ilustração: Marc Chagall)
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