quinta-feira, 24 de março de 2011

AREIA, de Natércia Freire






Areia pisada,

areia dorida,

areia beijada,

areia batida,

areia doirada,

areia estendida,

areia rolada,

rolada na vida.


Frescura abraçada

ao mar que se vai,

e os braços crispados

pregados num ai.

E a areia rolada

nos olhos profundos,

e as matas de sombra

ao fundo dos mundos…


E o paço de pedra

Erguido no espaço

e as capelas tristes

que perco e abraço…


E o sonho do vento,

que gela e que deixa,

e a voz que ergo e calo

e é vida e é queixa…


Os degraus que subo

e são mais que cem,

e os cisnes vogando

nos lagos de além…


E as estradas brandas

onde correm fontes,

e as moças que sonham

sem verem os montes…


E os bancos abertos

aos corpos cansados,

e a chuva da tarde

nos parques molhados…


E os riscos de luz

que bordam o Céu,

e a cortina branca

que ao Sol me escondeu…


E os quartos alheios

que giram à roda,

e as vozes na estrada

que me tolhem toda…


E eu dentro de um sonho

suspensa e vibrante

- areia beijada num mar mais distante –

e rica e mais longa,

e presa e mais livre

- sem mal e sem vida…


Areia doirada,

areia estendida,

areia rolada,

rolada na vida!



(Horizonte Fechado, 1942)



(Ilustração: Balthus – the mountain)

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