Textos, apenas textos, literários e poéticos, históricos e filosóficos, dramáticos e humorísticos; narrativos, descritivos ou dissertativos; de autores de todos os cantos do mundo...
sexta-feira, 29 de março de 2024
SOCIOGÊNESE DA DIFERENÇA ENTRE "KULTUR" E "ZIVILISATION" NO EMPREGO ALEMÃO: INTRODUCÃO, de Norbert Elias
terça-feira, 26 de março de 2024
O SABIÁ E O GAVIÃO, de Patativa do Assaré
Eu nunca falei à toa.
Sou um cabôco rocêro,
Que sempre das coisa boa
Eu tive um certo tempero.
Não falo mal de ninguém,
Mas vejo que o mundo tem
Gente que não sabe amá,
Não sabe fazê carinho,
Não qué bem a passarinho,
Não gosta dos animá.
Já eu sou bem deferente.
A coisa mió que eu acho
É num dia munto quente
Eu i me sentá debaxo
De um copado juazêro,
Prá escutá prazentêro
Os passarinho cantá,
Pois aquela poesia
Tem a mesma melodia
Dos anjo celestiá.
Não há frauta nem piston
Das banda rica e granfina
Pra sê sonoroso e bom
Como o galo de campina,
Quando começa a cantá
Com sua voz naturá,
Onde a inocença se incerra,
Cantando na mesma hora
Que aparece a linda orora
Bejando o rosto da terra.
O sofreu e a patativa
Com o canaro e o campina
Tem canto que me cativa,
Tem musga que me domina,
E inda mais o sabiá,
Que tem premêro lugá,
É o chefe dos serestêro,
Passo nenhum lhe condena,
Ele é dos musgo da pena
O maiô do mundo intêro.
Eu escuto aquilo tudo,
Com grande amô, com carinho,
Mas, às vez, fico sisudo,
Pruquê cronta os passarinho
Tern o gavião maldito,
Que, além de munto esquisito,
Como iguá eu nunca vi,
Esse monstro miserave
É o assarsino das ave
Que canta pra gente uví.
Muntas vez, jogando o bote,
Mais pió de que a serpente,
Leva dos ninho os fiote
Tão lindo e tão inocente.
Eu comparo o gavião
Com esses farão cristão
Do instinto crué e feio,
Que sem ligá gente pobre
Quê fazê papé de nobre
Chupando o suó alêio.
As Escritura não diz,
Mas diz o coração meu:
Deus, o maió dos juiz,
No dia que resorveu
A fazê o sabiá
Do mió materiá
Que havia inriba do chão,
O Diabo, munto inxerido,
Lá num cantinho, escondido,
Também fez o gavião.
De todos que se conhece
Aquele é o passo mais ruim
É tanto que, se eu pudesse,
Já tinha lhe dado fim.
Aquele bicho devia
Vivê preso, noite e dia,
No mais escuro xadrez.
Já que tô de mão na massa,
Vou contá a grande arruaça
Que um gavião já me fez.
Quando eu era pequenino,
Saí um dia a vagá
Pelos mato sem destino,
Cheio de vida a iscutá
A mais subrime beleza
Das musga da natureza
E bem no pé de um serrote
Achei num pé de juá
Um ninho de sabiá
Com dois mimoso fiote.
Eu senti grande alegria,
Vendo os fíote bonito.
Pra mim eles parecia
Dois anjinho do Infinito.
Eu falo sero, não minto.
Achando que aqueles pinto
Era santo, era divino,
Fiz do juazêro igreja
E bejei, como quem bêja
Dois Santo Antõi pequenino.
Eu fiquei tão prazentêro
Que me esqueci de armoçá,
Passei quage o dia intêro
Naquele pé de juá.
Pois quem ama os passarinho,
No dia que incronta um ninho,
Somente nele magina.
Tão grande a demora foi,
Que mamãe (Deus lhe perdoi)
Foi comigo à disciprina.
Meia légua, mais ou meno,
Se medisse, eu sei que dava,
Dali, daquele terreno
Pra paioça onde eu morava.
Porém, eu não tinha medo,
Ia lá sempre em segredo,
Sempre. iscondido, sozinho,
Temendo que argúm minino,
Desses perverso e malino
Mexesse nos passarinho.
Eu mesmo não sei dizê
O quanto eu tava contente
Não me cansava de vê
Aqueles dois inocente.
Quanto mais dia passava,
Mais bonito eles ficava,
Mais maió e mais sabido,
Pois não tava mais pelado,
Os seus corpinho rosado
Já tava tudo vestido.
Mas, tudo na vida passa.
Amanheceu certo dia
O mundo todo sem graça,
Sem graça e sem poesia.
Quarqué pessoa que visse
E um momento refritisse
Nessa sombra de tristeza,
Dava pra ficá pensando
Que arguém tava malinando
Nas coisa da Natureza.
Na copa dos arvoredo,
Passarinho não cantava.
Naquele dia, bem cedo,
Somente a coã mandava
Sua cantiga medonha.
A menhã tava tristonha
Como casa de viúva,
Sem prazê, sem alegria
E de quando em vez, caía
Um sereninho de chuva.
Eu oiava pensativo
Para o lado do Nascente
E não sei por quá motivo
O só nasceu diferente,
Parece que arrependido,
Detrás das nuve, escondido.
E como o cabra zanôio,
Botava bem treiçoêro,
Por detrás dos nevoêro,
Só um pedaço do ôio.
Uns nevoêro cinzento
Ia no espaço correndo.
Tudo naquele momento
Eu oiava e tava vendo,
Sem alegria e sem jeito,
Mas, porém, eu sastifeito,
Sem com nada me importá,
Saí correndo, aos pinote,
E fui repará os fiote
No ninho do sabiá.
Cheguei com munto carinho,
Mas, meu Deus! que grande agôro!
Os dois véio passarinho
Cantava num som de choro.
Uvindo aquele grogeio,
Logo no meu corpo veio
Certo chamego de frio
E subindo bem ligêro
Pr’as gaia do juazêro,
Achei o ninho vazio.
Quage que eu dava um desmaio,
Naquele pé de juá
E lá da ponta de um gaio,
Os dois véio sabiá
Mostrava no triste canto
Uma mistura de pranto,
Num tom penoso e funéro,
Parecendo mãe e pai,
Na hora que o fio vai
Se interrá no cimitéro.
Assistindo àquela cena,
Eu juro pelo Evangéio
Como solucei com pena
Dos dois passarinho véio
E ajudando aquelas ave,
Nesse ato desagradave,
Chorei fora do comum:
Tão grande desgosto tive,
Que o meu coração sensive
Omentou seus baticum.
Os dois passarinho amado
Tivero sorte infeliz,
Pois o gavião marvado
Chegou lá, fez o que quis.
Os dois fiote tragou,
O ninho desmantelou
E lá pras banda do céu,
Depois de devorá tudo,
Sortava o seu grito agudo
Aquele assassino incréu.
E eu com o maiô respeito
E com a suspiração perra,
As mão posta sobre o peito
E os dois juêio na terra,
Com uma dó que consome,
Pedi logo em santo nome
Do nosso Deus Verdadêro,
Que tudo ajuda e castiga:
Espingarda te preciga,
Gavião arruacêro!
Sei que o povo da cidade
Uma idéia inda não fez
Do amô e da caridade
De um coração camponês.
Eu sinto um desgosto imenso
Todo momento que penso
No que fez o gavião.
E em tudo o que mais me espanta
É que era Semana Santa!
Sexta-fêra da Paixão!
Com triste rescordação
Fico pra morrê de pena,
Pensando na ingratidão
Naquela menhã serena
Daquele dia azalado,
Quando eu saí animado
E andei bem meia légua
Pra bejá meus passarinho
E incrontei vazio o ninho!
Gavião fí duma égua!
(Dois Quadros)
(Ilustração: Henry Blache, Sax)
sábado, 23 de março de 2024
A OUTRA NOITE, de Rubem Braga
quarta-feira, 20 de março de 2024
POEMA DEL RENUNCIAMIENTO / POEMA DA RENÚNCIA, de José Angel Buesa
Pasarás por mi vida sin saber que pasaste.
Pasarás en silencio por mi amor y, al pasar,
fingiré una sonrisa como un dulce contraste
del dolor de quererte... y jamás lo sabrás.
Soñaré con el nácar virginal de tu frente,
soñaré con tus ojos de esmeraldas de mar,
soñaré con tus labios desesperadamente,
soñaré con tus besos... y jamás lo sabrás.
Quizás pases con otro que te diga al oído
esas frases que nadie como yo te dirá;
y, ahogando para siempre mi amor inadvertido,
te amaré más que nunca... y jamás lo sabrás.
Yo te amaré en silencio... como algo inaccesible,
como un sueño que nunca lograré realizar;
y el lejano perfume de mi amor imposible
rozará tus cabellos... y jamás lo sabrás.
Y si un día una lágrima denuncia mi tormento,
-el tormento infinito que te debo ocultar-,
te diré sonriente: «No es nada... ha sido el viento».
Me enjugaré una lágrima... ¡y jamás lo sabrás!
Tradução de Jefferson Vasques:
Passarás por minha vida sem saber que passaste.
Passarás em silêncio por meu amor, e ao passar,
fingirei um sorriso, como um doce contraste
da dor de querer-te… e jamais o saberás.
Sonharei com o nácar virginal de tua fronte;
sonharei com teus olhos de esmeraldas de mar;
sonharei com teus lábios desesperadamente;
sonharei com teus beijos… e jamais o saberás.
Quiçá passes com outro que te diga ao ouvido
essas frases que ninguém como eu te dirá;
e, afogando para sempre meu amor inadvertido,
te amarei mais que nunca… e jamais o saberás.
Eu te amarei em silêncio, como algo inacessível,
como um sonho que nunca lograrei realizar;
e o distante perfume de meu amor impossível
roçará teus cabelos … e jamais o saberás.
E se um dia uma lágrima denuncia meu tormento,
— o tormento infinito que te devo ocultar —
te direi sorridente: “Não é nada … foi o vento”.
Enxugarei a lágrima … e jamais o saberás!
(Ilustração: Marcel Duchamp - étude nu jeune homme triste dans un train)
domingo, 17 de março de 2024
A CHEGADA DE VIRGÍLO A BRINDÍSIO, de Herman Broch
quinta-feira, 14 de março de 2024
QUID FACIAT LAETAS SEGETES / O QUE DÁ VIÇO ÀS SEARAS ALEGRES (DAS GEÓRGICAS - ÉCLOGA I), de Virgílio
Quid faciat laetas segetes, quo sidere terram
uertere, Maecenas, ulmisque adiungere uites
conueniat, quae cura boum, qui cultus habendo
sit pecori, apibus quanta experientia parcis,
hinc canere incipiam. uos, o clarissima mundi 5
lumina, labentem caelo quae ducitis annum;
Liber et alma Ceres, uestro si munere tellus
Chaoniam pingui glandem mutauit arista
poculaque inuentis Acheloia miscuit uuis;
et uos, agrestum praesentia numina, Fauni, 10
ferte simul Faunique pedem Dryadesque puellae:
munera uestra cano; tuque o, cui prima frementem
fudit equum magno tellus percussa tridenti,
Neptune; et cultor nemorum, cui pinguia Ceae
ter centum niuei tondent dumeta iuuenci; 15
ipse nemus linquens patrium saltusque Lycaei
Pan, ouium custos, tua si tibi Maenala curae,
adsis, o Tegeaee, fauens, oleaeque Minerua
inuentrix, uncique puer monstrator aratri,
et teneram ab radice ferens, Siluane, cupressum: 20
dique deaeque omnes, studium quibus arua tueri
quique nouas alitis non ullo semine fruges
quique satis largum caelo demittitis imbrem.
tuque adeo, quem mox quae sint habitura deorum
concilia incertum est, urbisne inuisere, Caesar, 25
terrarumque uelis curam, et te maximus orbis
auctorem frugum tempestatumque potentem
accipiat cingens materna tempora myrto;
an deus immensi uenias maris ac tua nautae
numina sola colant, tibi seruiat ultima Thule, 30
teque sibi generum Tethys emat omnibus undis;
anne nouum tardis sidus te mensibus addas,
qua locus Erigonen inter Chelasque sequentis
panditur: ipse tibi iam bracchia contrahit ardens
Scorpios et caeli iusta plus parte reliquit; 35
quidquid eris (nam te nec sperant Tartara regem,
nec tibi regnandi ueniat tam dira cupido,
quamuis Elysios miretur Graecia campos
nec repetita sequi curet Proserpina matrem),
da facilem cursum atque audacibus adnue coeptis 40
ignarosque uiae mecum miseratus agrestis
ingredere et uotis iam nunc adsuesce uocari.
Vere nouo, gelidus canis cum montibus umor
liquitur et Zephyro putris se glaeba resoluit,
depresso incipiat iam tum mihi taurus aratro 45
ingemere et sulco attritus splendescere uomer.
illa seges demum uotis respondet auari
agricolae, bis quae solem, bis frigora sensit;
illius immensae ruperunt horrea messes.
ac prius ignotum ferro quam scindimus aequor, 50
uentos et uarium caeli praediscere morem
cura sit ac patrios cultusque habitusque locorum,
et quid quaeque ferat regio et quid quaeque recuset.
hic segetes, illic ueniunt felicius uuae,
arborei fetus alibi atque iniussa uirescunt 55
gramina. nonne uides croceos ut Tmolus odores,
India mittit ebur, molles sua tura Sabaei,
at Chalybes nudi ferrum uirosaque Pontus
castorea, Eliadum palmas Epiros equarum?
continuo has leges aeternaque foedera certis 60
imposuit natura locis, quo tempore primum
Deucalion uacuum lapides iactauit in orbem,
unde homines nati, durum genus. ergo age, terrae
pingue solum primis extemplo a mensibus anni
fortes inuertant tauri, glaebasque iacentis 65
puluerulenta coquat maturis solibus aestas;
at si non fuerit tellus fecunda, sub ipsum
Arcturum tenui sat erit suspendere sulco:
illic, officiant laetis ne frugibus herbae,
hic, sterilem exiguus ne deserat umor harenam. 70
Tradução de Arthur Rodrigues Santos:
O que dá viço às searas alegres, sob qual astro
deve-se a terra, Mecenas, volver e casar as videiras
com os olmeiros, quais cuidados ao boi e ao rebanho
são dispensados, quanta perícia às parcas abelhas:
eis o que agora celebro. Vós, ó luzeiros brilhantes 5
deste mundo, guiando no céu o ano que escoa;
Líber e Ceres nutriz, a terra, com a vossa anuência,
pôde trocar Caônias bolotas por trigo graúdo
e misturar o copo Aqueloio às uvas achadas;
vós também, propícios aos lavradores, ó Faunos, 10
vinde dançando, Faunos, ao lado das Dríades ninfas:
vossos dons eu celebro; e tu, que a terra fendeste
com teu tridente, donde surgiu o fogoso cavalo,
ó deus Netuno; e tu boscarejo, a quem uns trezentos
níveos vitelos pastam de Cea fecunda os arbustos; 15
tu, que abandonas o bosque natal e as Liceias clareiras,
Pã, guardião das ovelhas, se o Mênalo inda te agrada,
vem até mim, ó Tegeu, me apoia; e Minerva, dadora
das oliveiras, e o jovem inventor do arado recurvo,
tu também, ó Silvano, trazendo extirpado cipreste: 20
todos, deuses e deusas, vós que zelais pelos campos,
ora nutrindo os novos rebentos não semeados,
ora enviando do céu a forte chuva às sementes.
E, finalmente, tu, de quem não sabemos qual posto
vais ocupar entre os deuses: se queres, César, o zelo 25
pelas cidades e campos, e o vasto universo te acolha
como o pai dos frutos e das estações o regente,
já coroando a tua fronte com murta de Vênus materna;
ou te tornes o deus do imenso mar e os marujos
só o teu nume cultuem e a extrema Tule te sirva, 30
Tétis te quer como genro a preço de todas as ondas;
ou, novo astro, te somes aos meses mais vagarosos,
onde um espaço entre Erígone e as Quelas vizinhas
ora se abre: vê, já contrai suas garras o ardente
Escorpião e deixou-te no céu uma parte folgada; 35
Seja quem fores (não és esperado no mundo Tartáreo
nem te acometa o terrível desejo deste reinado,
mesmo que a Grécia tanto admire os Campos Elíseos
e Proserpina se furte a voltar com a mãe para cima),
fácil percurso me dá, consente o propósito ousado 40
e, compassivo comigo dos lavradores sem rumo,
vem até mim e já te acostuma a ouvir nossas preces.
A primavera revém, dos cândidos montes escorre
frio regato e o Zéfiro quebra o torrão ao seu sopro:
já me comece o touro a gemer no arado tanchado 45
e recupere seu brilho a relha atrita com sulcos.
Só corresponde aos votos do lavrador ansioso
campo que duas vezes sentiu o sol e a friagem;
sua imensa colheita acabou de romper os celeiros.
Antes, porém, de cortarmos com ferro um solo ignoto, 50
cumpre primeiro estudar o vento e o clima mutável,
a qualidade das terras e a prática antiga legada,
o que produz um lugar e também o que ele nos nega.
Trigo vai bem por aqui, por ali, as uvas vigoram,
mais além enverdecem o novo arvoredo e a selvagem 55
erva. Não vês que o Tmolo exporta açafrão perfumado,
Índia marfim, os Sabeus delicados seu típico incenso,
ferro das minas os Cálibes nus, o Ponto castóreo
nauseabundo e o Epiro vitórias das éguas em Élis?
A natureza impôs essas leis e contratos eternos 60
para lugares determinados assim que no mundo,
antes vazio, Deucalião lançou as suas pedras,
delas os homens nasceram, dura progênie. Ao trabalho!
Já no começo do ano, revolvam o gordo terreno
touros fortes, dessa forma as leivas expostas 65
sejam cozidas ao sol maturado do estio pulvéreo;
mas, sendo a terra pouco fecunda, basta somente
leve amanho de sulco no despontar do Arcturo:
lá, as ervas daninhas não tolhem messes alegres,
cá, não deserta a pouca umidade do seco terreno. 70
(Ilustração: autor desconhecido - ilustração do século XV para as éclogas de Virgílio)
segunda-feira, 11 de março de 2024
PABLITO CLAVÓ UN CLAVITO: UMA EVOCAÇÃO DO BAIXINHO ORELHUDO, de Mariana Enriquez
sexta-feira, 8 de março de 2024
MAR DE SARGAÇOS, de Geraldo Carneiro
no seu maremoto de sargaços
negros
na sua garganta minha
caravela
começa de novo nos quintais
vazios
a plantar canteiros no meio
da noite
nos seus alagados e no fim
de tudo
a cantar baladas de uma
estranha lua
entre os peixes mortos onde
algum corsário
a tramar batalhas no seu mar
profundo
recolhendo gritos nas suas
entranhas
vaga submerso a beber
escolhos
de outros naufrágios de
cristais marinhos
no seu mar profundo no meio
da noite
a beber escolhos de uma
estranha lua
a tramar batalhas nas suas
entranhas
onde algum corsário vaga
submerso
a cantar baladas nos seus
alagados
recolhendo gritos de outros
naufrágios
na sua garganta de cristais
marinhos
a plantar canteiros de
sargaços negros
nos quintais vazios no seu
maremoto
e no fim de tudo entre os
peixes mortos
começa de novo minha
caravela
(Ilustração: Egon
Schiele - Girl with Black Hair (Mädchen mit schwarzem Haar) c.1911)
terça-feira, 5 de março de 2024
DIÁRIOS, de Lúcio Cardoso(*)