Os homens do Romeu Tuma,
prepotentes e embalados,
foram dar uma batida
na tribo dos guajajaras.
Queriam localizar,
pra acabar de vez com ela,
a plantação de maconha
que, segundo haviam dito,
esses índios cultivavam
no sertão do Maranhão.
Lá na aldeia de Coquinhos
os homens bravos do Tuma
já chegaram dando tiros,
matando cachorros mansos
que apenas comiam pulgas.
Curumins apavorados
corriam que nem cutia
da polvorosa imprevista,
enquanto cunhãs e velhas,
aflitas, choravam sem
entender o que é que havia.
“De que se trata?”, diziam
na língua dos guajajaras:
“Que querer aqui fazer
os ruins caramurus?”
Os de fora, dos seus carros
barulhentos que nem tanques
numa ofensiva de guerra,
iam só mandando bala
por entre as choças tranquilas,
furando bambus e sacos,
vasilhames e bacias
com pontaria certeira.
Mas o espírito das matas
(cinco séculos de fúria
sob contínuos massacres)
de repente correu solto
no meio dos guajajaras.
Armando-se de cacetes,
o desespero do orgulho
e a valentia das onças,
os índios antes perplexos
com a louca invasão dos brutos
pularam dando pauladas,
de peito nu e aberto,
contra os tiros da polícia.
E deram tanto, mas tanto,
foram tantas cacetadas
de toda uma raça extinta,
era tão justa a refrega
dos caboclos de Tupã,
tão fraternos e preciosos
os golpes do contra-ataque,
que não houve jamais como
o pelotão resistir.
Seus carros antes possantes
ficaram despedaçados
e nenhum tira escapou:
todos levaram porrada.
Sem armas nem munições,
que os índios depois tomaram,
a polícia foi em cana
metendo o rabo entre as pernas.
Com o bando da lei detido
numa palhoça de varas,
mais pauladas foram dadas,
dessa vez como castigo,
por um ancião da tribo
e o cadáver do cachorro
(nosso irmão e nosso espelho)
assassinado por eles
a seguir foi esfregado
na cara de cada um.
De Brasília, o Romeu Tuma
com seus capangas mais fortes
foi lá conversar com os índios
para soltar os reféns.
Encontrou os guajajaras
preparados para a guerra
com suas caras pintadas.
Talvez não tivesse visto,
mas ventos elementares
faziam tremer a terra
por toda a Barra do Corda.
Sob o calor dos coqueiros,
cocares de antigas lutas
na glória da resistência
faziam gestos simbólicos.
Por trás de cada cunhã
com riscos na face triste,
foram hordas de fantasmas
tomados de amor da terra
que o Romeu Tuma encontrou.
Bom de papo, bem treinado
nas rodinhas de Brasília
depois de muita conversa
conseguiu a liberdade
dos subalternos detidos.
Mas as armas dos seus homens
os guajajaras não deram.
E agora, depois de tanta
estripulia e arbítrio,
impõem uma condição
para entregá-las aos donos:
que os brancos também devolvam,
por estar em suas terras,
o povoado já famoso
e bem, enfim, guajajara
pelas ressonâncias do nome
que é São Pedro dos Cacetes.
(Ilustração: índios guajajaras - foto de Vincent Carelli, 1980)
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