eles vinham da missa.
eles vinham da missa sozinhos.
traziam nos olhos o céu
nos pés talvez trouxessem
o coração.
eles vinham da missa …
mas eles vinham da missa sozinhos!
traziam nas mãos pechisbeques
unhas rentes oração
piolhos imaginados
um certo olhar vazio aveludado
em certo estilo
uma faca cravada nos dentes
uma amante nos slip’s
o põe-e-tira-a-chaga e tira-aquilo
dois lábios cronometrados
uma 6ª feira no adro
um frade no sermão.
eles vinham como um fardo.
eles vinham como o vinho.
eles vinham da missa amestrados
eles vinham consagrados.
e traziam à volta um chimpanzé
que lhes vendia a medo o império do Cavaco.
eles vinham da missa sozinhos
rodas-baixas na oração
com as damas pelos joelhos
ão, ão,
ao serviço dos supermercados.
eles vendiam a porcaria da Justiça
às galinhas da Praça!,
à Mexicana,
aos gelados sacré-coeur noites de Verão
eles traziam plantas carnívoras
nas barbas e nos lábios.
aos milhares como galáxias
eles diziam-se meus irmãos.
eles tinham um olho no deserto
e Outro ao lado das mãos.
eles vinham da missa.
eles vinham da notre-dame-nulle-part,
bourdel das lágrimas vazias,
pirâmides de Ravel.
mas está na moda um tumor de vez em quando
ou o Roberto Carneiro ou o Carneiro Carneiro
pisca-pisca na televisão.
eles tinham de facto filhos
como bolas de sabão,
e a mulher era a Nossa Senhora da Face das Papoilas
a constituir uma equipe de football.
às vezes eles saíam da missa aos domingos
com facas nas algibeiras,
faziam-se peditórios palestras
marchas Stº Antónios
uma marca na lapela
e está tudo a postos para a Gravação:
o céu a clientela o Santo Padre nas janelas
como um fantasma ao Sol.
eles tinham fome e roubavam
as estrelas moribundas que passavam.
ah! eles vinham da missa aos molhos
como uma procissão.
usam no próprio nome a Praça
e o desespero suga-lhes o coração
os termos a graça a raça
a Primavera de costas as mãos.
eu própria eu sei
que a Arte é uma coisa muito perigosa!
mas eles saem da missa
na vela dos seus iates.
e quando o Amor sopra
eles comem lagosta
no bidé da Praça.
eles fazem sempre amor quando o sacrário se abre.
eles inclinam as cabeças.
e se o Inverno intempestuosamente passa
eles põem olhos-de-sofrer nas gravatas.
eles são como flores fechadas
no enterro das Praças.
roubaram todo o ano o Templo dos Anarquistas!
eles sabem que a Arte é perigosa.
eles sabem que a Arte é preparada
Hora-a-Hora e não acaba.
eles têm medo quiçá das trevas do esteves cardoso
do Portas dos Poetas dos loucos dos pobres
dos filhos-de-Nada dos fala-Baratas
e por isso comem mortos!
mil e uma vezes eles sabem
que as armas dos Artistas
derrubam as Grades: a televisão os cigarros
as regras a macrobiótica
as greves os corpos
os deputados as datas,
quais fumos em Altos-fornos
por onde a gente passa!…
eles saem da missa sozinhos
mascando Haxe nos lábios.
eles fumam a favor da Liberdade.
eles sabem que estão salvos.
eles sabem que são bonzinhos.
eles sabem que Deus é Deus
e Deus sabe tudo como eles.
eles sabem jazz eles sabem eletricidade.
eles conhecem Expo-Sevilha,
eles sabem Fado.
eles sabem tudo.
eles comem tudo.
eles são a grafonola da Canalha.
a morte p’ra eles é Pop,
é molinha tem I.V.A. e tudo!
porque os outros é que morrem.
os outros é que atravessam
a porcaria da História,
com discursos com ruas
com buraquinhos
com beijocas nos cemitérios
com os Lusíadas debaixo do braço
com a Demasia do Pessoa
com a série-noire do Vang Gof
com panfletos na pátria
com moscas no cafezinho.
eles sabem que a Arte é perigosa.
eles são Pop!
são a estereofonia ouvida em mono.
eles vêm da missa de jeep
como cristóvão colombo de barco.
eles trazem a América no carro.
eles pintam a morte num abrir e fechar dólhos
como que a dedilhar uma trova
e os pobres dão-lhes um osso.
e eles mordem.
eles são mesmo óptimos!
estão salvos com o céu todo.
eles vivem no caixão do Padre.
eles sabem que a Reencarnação
é uma ideia retrógrada.
eles sabem tudo. eles sabem Nada.
eles usam Nódoas.
eles vão ao “dancing”
ao “Bora-Bora” ao “Trumps”
eles vão pôr flores nos campos
relinchando orações pela boca-fora.
eles dançam às modas.
eles trazem um tremoço de Dante
no nevoeiro de D. Sebastião.
eles usam saco. eles usam molas.
eles usam até as metáforas na Televisão.
eles usam tudo.
eles sabem tudo.
eles comem tudo.
eles fedem tudo.
eles usam até binóculos
para dançar à espanhola na História.
Olé! Olé! Olé!
eles sabem que a Arte
é a coisa mais perigosa!
por isso a Greve sendo pomposa
é um processo estatelado na Cova.
nunca se deve fazer Greve
a favor de Nada.
a Greve é o Cartoon do Cunhal.
a Greve é construção-Naval.
a Greve é um grande Carnaval:
compra a mãe compra o padre
compra o filho num segundo
compra todo o mundo.
compra tudo.
o que se deve é fazer Arte.
Arte é Diálogo!
Arte aos Berros! Arte Triunfal! Arte no Pontão!
Arte no Porão!
Arte no Coração!
Arte no Sangue! Arte na Garganta!
Arte às mãos-cheias da matéria
das galáxias!
Arte nas Igrejas! Arte nos Cavalos!
Arte no Jornal!
Arte nas crianças!
a Arte só se deve Vender às Baleias!
a Arte é o Espírito-todo o ano
todo o ouro atravessado nas igrejas.
a Arte é uma pedra violada
pelo chão!
a Arte é um Anjo!
a Arte é um carro envolto em nevoeiro
às buzinadelas na estrada,
a Arte meu Deus
não é uma ideia!
a Arte é Virgindade!
a Arte é reencarnação!
a Arte é a chuva
reencarnada nas montanhas!
a Arte é o vento
espetado nas veias,
a Arte é no mundo não haver Cadeias!
a Arte é o Amor amar todos por igual!
a Arte é tudo!
a Arte é Sinfonia!
a Arte é o maior Sinal!
mas eles saem da missa sem ideias…
eles saem para a rua
perfurados como um cartão …
E eu sou
como dizer-lhes?!
um Poeta de Variedades!!!
(Ilustração: Fred Benoit - La nonne dévoilée)
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