quarta-feira, 30 de novembro de 2022

MODOS DE AMAR , de Maria Tereza Horta

 





Modo de amar – I



Lambe-me os seios

desmancha-me a loucura



usa-me as coxas

devasta-me o umbigo



abre-me as pernas

põe-nas nos teus ombros



e lentamente faz o que te digo:



Modo de amar – II



Por-me-ás de borco,

assim inclinada...



a nuca a descoberto,

o corpo em movimento...



a testa a tocar

a almofada,

que os cabelos afloram,

tempo a tempo...



Por-me-ás de borco;

Digo:

ajoelhada...



as pernas longas

firmadas no lençol...



e não há nada, meu amor,

já nada, que não façamos como quem consome...



(Por-me-ás de borco,

assim inclinada...



os meus seios pendentes

nas tuas mãos fechadas.)



Modo de amar – III



É bom nadar assim

em cima do teu corpo

enquanto tu mergulhas já dentro do meu



Ambos piscinas que a nado atravessamos

de costas tu meu amor

de bruços eu



Modo de amar – IV



Encostada de costas

ao teu peito



em leque as pernas

abertas

o ventre inclinado



ambos de pé

formando lentos gestos



as sombras brandas

tombadas no soalho



Modo de amar – V



Docemente amor

ainda docemente



o tacto é pouco

e curvo sob os lábios



e se um anel no corpo

é saliente

digamos que é da pedra

em que se rasga



Opala enorme

e morna

tão fremente



dália suposta

sob o calor da carne



lábios cedidos

de pétalas dormentes



Louca ametista

com odores de tarde



Avidamente amor

com desespero e calma



as mãos subindo

pela cintura dada

aos dedos puros

numa aridez de praia

que a curvam loucos até ao chão da sala



Ferozmente amor

com torpidez e raiva



as ancas descendo como cabras

tão estreitas e duras

que desarmam

a tepidez das minhas

que se abrem



E logo os ombros

descaem

e os cabelos



desfalecem as coxas que retomam

das tuas

o pecado

e o vencê-lo

em cada movimento em que se domam



Suavemente amor

agora velozmente



os rins suspensos

os pulsos

e as espáduas



o ventre erecto

enquanto vai crescendo

planta viva entre as minhas nádegas



Modo de amar – Vl



Inclina os ombros

e deixa

que as minhas mãos avancem

na branda madeira



Na densa madeixa do teu ventre



Deixa

que te entreabra as pernas

docemente



Modo de amar – VII



Secreto o nó na curva

do meu espasmo



E o cume mais claro

dos joelhos

que desdobrados jorram dos espelhos



ou dos teus ombros os meus:

flancos

na luz de maio



Modo de amar – VIII



Que macias as pernas

na penumbra



e as ancas

subidas

nos dedos que as desviam



Entreabro devagar

a fenda – o fundo

a febre

dos meus lábios



e a tua língua

Vagarosa:



toma – morde

lambe

essa humidade esguia



Modo de amar – IX



Enlaçam as pernas

as pernas

e as ancas



o ar estagnado

que se estende

no quarto



As pernas que se deitam

ao comprido

sob as pernas



E sobre as pernas vencem o gemido



Flor nascida no vagar do quarto



Modo de amar – X



A praia da memória

a sulcos feita

a partir da cintura:



a boca

os ombros



na tua mansa língua que caminha

a abrir-me devagar

a pouco e pouco



Globo onde a sede

se eterniza

Piscina onde o tempo se desmancha

a anca repousada

que inclinas

as pernas retesadas que levantas



E logo

são os dentes que limitam



mas logo

estão os lábios que adormentam

no quente retomar de uma saliva

que me penetra em vácuo

até ao ventre



o vínculo do vento

a vastidão do tempo



o vício dos dedos

no cabelo



E o rigor dos corpos

que já esquece

na mais lenta maneira de vencê-los



Modo de amar – XI



((Teu) Baixo ventre)



Nunca adormece a boca no

teu peito



a minha boca no teu baixo

ventre

a beber devagar o que é

desfeito



Modo de amar – XII

(Os testículos)



Tenho nas mãos

teus testículos

e a boca já tão perto



que deles te sinto

o vício

num gosto de vinho aberto



Modo de amar – XIII



(As pedras – As pernas)



São as pedras

meus seios

São as pernas



pele e brandura

no interior dos

lábios



rosa de leite

que sobe devagar

na doce pedra

do muco dos meus lábios



São as pedras

meus seios

São as pernas



Pêssegos nus corpo

descascados



Saliva acesa

que a língua vai cedendo



o gozo em cima...

na pedra dos meus

lábios



Jogo do corpo

a roçar o tempo

que já passado só se de memória,

a mão dolente

como quem masturba entre os joelhos...

uma longa história...



Estrada ocupada

onde se vislumbra

(joelhos desviados na almofada)



assim aberta o fim de que desfruta

o fruto do odor

o fundo todo

do corpo já fechado.



Modo de amar – XIV

(As rosas nos joelhos)



São grinaldas de rosas

à roda

dos joelhos



O âmbar dos teus dentes

nos sentidos



O templo da boca

no côncavo do espelho

onde o meu corpo espia

os teus gemidos



É o gomo depois...

e em seguida a polpa...



o penetrar do dedo...

O punho do punhal



que na carne enterras

docemente

como quem adormenta

o que é fatal



É a urze debaixo

e o fogo que acalenta

o peixe

que desliza no umbigo



piscina funda

na boca mais sedenta bordada a cuspo

na pele do umbigo



E se desdigo a febre

dos teus olhos

logo me entrego à febre

do teu ventre



que vai vencendo

as rosas – os escolhos

à roda dos joelhos, docemente.



Modo de amar – XV



(A boca – A rosa)



Entreabre-se a boca

na saliva da rosa



no raso da fenda

na fissura das pernas



Entreabre-se a rosa

na boca que descerra

no topo do corpo

a rosa entreaberta



E prolonga-se a haste

a língua na fissura

na boca da rosa

na caverna das pernas



que aí se entre-curva

se afunda

se perde



se entreabre a rosa

entre a boca

das pétalas





(Ilustração: Vincent Desiderio)



Nenhum comentário:

Postar um comentário