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o homem que comeu minha mãe -
o primeiro -
era moreno
meio mouro
meio bugre
o cabelo preto muito preto
e uma lábia de vendedor de enciclopédias
o homem que comeu minha mãe
chegou no lombo de uma Caloi
cowboy nordestino
de sapato bico fino
calça pantalona
brilhantina no cabelo
e uma peixeira calibre 22
minha mãe caminhou sobre as águas
tocou banjo com anjos alcoólatras
e passou merthiolate nas chagas de Cristo
o homem que comeu minha mãe
foi embora no intervalo de um Corinthians e Bangu
disse que ia comprar cigarros
e desapareceu numa nuvem de gafanhotos
minha mãe desceu à mansão dos mortos
lambeu as sarnas de Cérbero
e pariu crisântemos nas vielas do inferno
virou uma bruxa chocha com o coração de jiló
que em noites de TPM cospe relâmpagos de sal
às vezes a velha olha através de mim
: tu és a cara do teu pai!
(Ilustração: Gerardo Sacristán Torralba,1929)
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