Rio de Janeiro, 18 de outubro de 1924.
Excelentíssimo senhor presidente da Academia Brasileira,
Desde que na sua última sessão a Academia rejeitou o projeto que apresentei no intuito de modernizar a sua atividade, dou por extinta a minha função acadêmica. Poderia afastar-me sem explicações, como outros já fizeram por motivos pessoais, num gesto de desdém por esta instituição. A atitude, porém, que tomo é de ordem geral e deve ser explicada. Convidado para membro fundador da Academia, escrevi a Lúcio de Mendonça recusando a minha participação por julgar a criação desse instituto prejudicial à nossa jovem literatura, cuja vibração e desordem fecunda seriam juguladas pelo espírito acadêmico. Machado de Assis e Joaquim Nabuco insistiram de tal forma pela minha colaboração, que, num sorriso cético, me resignei à Academia, louvando a incoerência, que me fazia companheiro de tão grandes espíritos, infrangíveis espelhos de educação e beleza moral para os acadêmicos. Longos anos deixei-me ficar nesse suave convívio, um pouco desinteressado dos trabalhos da Academia. Ultimamente resolvi intervir no movimento literário brasileiro. A Academia é uma contradição do espírito moderno, que agita e transforma todo o Brasil. Perante a opinião pública, que a deve policiar, entendi estimular a Academia a orientar-se por esse espírito novo. Em seguida às palavras que lhe dirigi, apresentei o projeto de reforma dos seus trabalhos com o propósito de nacionalizar-lhe e modernizar-lhe a ação. O projeto foi rejeitado. A Academia quer persistir na sua posição eclética e antiquada, nefasta à literatura brasileira. Recusa-se a tornar-se um organismo útil e ativo, um fator do moderno sentimento nacional, seu representativo, seu guia. A Academia Brasileira morreu para mim, como também não existe para o pensamento e para a vida atual do Brasil.
Se fui incoerente aí entrando e permanecendo, separo-me da Academia pela coerência.
Queira, senhor presidente, receber as expressões da alta consideração do seu admirador e amigo.
Graça Aranha
(O Modernismo na Academia: testemunhos e documentos).
(Ilustração: Portinari - descobrimento do Brasil)
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