Na inelutável necessidade do amor (era quase primavera) pombo e pomba marcaram um encontro galante quando voavam e revoavam no azul do Rio de Janeiro. Era bem de manhãzinha.
- Às quatro em ponto me casarei contigo no mais alto beiral – disse o pombo.
- Candelária? – perguntou a noiva.
- Do lado norte – respondeu ele.
Pois, às quatro azul em ponto, a pomba pontualíssima pousava pensativamente no beiral. O pombo? O pombo não.
A pombinha, que era branca sem exagero, arrulhava, humilhada e ofendida com o atraso, contemplando acima do campanário todas as possibilidades da rosa-dos-ventos. Mas na paisagem do céu voavam só velozes andorinhas garotas porque as andorinhas mais velhas enfileiravam-se nas cornijas, pensando na morte, como gente fina, lá dentro nos dias solenes de missa de réquiem.
Quatro e dez. Quatro e um quarto. Uma pomba sozinha, à mercê quem sabe de um gavião, lendário mas possível. Sol e sombra. Como custa a passar um quarto de hora para uma noiva que espera o noivo no mais alto beiral. Como a brisa é triste. Como se humilha em revolta a noiva branca.
Ah, arrulhou de repente a pomba, quando distinguiu, indignada, o pombo que chegava, o pombo que chegava caminhando pelo beiral mais alto, do outro lado, lá onde, um pouco além, gritavam esganadas as gaivotas do mar pardo do mercado. Irônica, perguntou a pomba:
- Perdeste a noção do tempo?
- Perdão, por Deus, perdão – respondeu o pombo: - Tardo mas ardo. Olha que tarde...
- Que tarde? – perguntou a pomba.
- Que tarde! Que azul! Que tarde azul!
- Mas e eu?! – disse a pomba. – Sozinha aqui em cima!
- A tarde era tão bonita – disse o pombo gravemente – a tarde era tão bonita, que era um crime voar, vir voando...
- Mas e eu?! Eu?! – queixava-se a pomba.
- A tarde era tão bonita – explicou o pombo com doce paciência – que eu vim andando, que eu tinha de vir andando, meu amor.
(Ilustração: Orlando de Sant'anna - Corcovado)
Olá, Isaias.
ResponderExcluirAqui é bem melhor!
Se precisar de qualuer ajuda, conte comigo.
Abraço.
Conheci esse texto quando estudava para EsSa. Maravilhoso.
ExcluirEu adoro esse texto ...
ResponderExcluirMuito lindo ... Fico so imaginando a paisagem do Rio de Janeiro, ótima para a ocasião.
O texto também é engraçado, do tipo comédia...
Valeu Paulo Mendes Campos!
a primeira vez que eu vi este texto eu tina 12 anos,cursava a 6ª serie e me apaixonei por ele. É simplesmente maravilhoso....
ResponderExcluirO mesmo aconteceu comigo até hoje. Na altura no 9 ano a Professora Lúcia Lepeki levou-o para a aula. Nunca vou esquecer nem a professora nem o texto
ExcluirAdorei o texto.Eu acho que esse teexto vai cair na minha prova de portugues!
ResponderExcluiré muito bom
ResponderExcluirhá muito tempo procuro esse texto! um dos mais lindos q ja li.Me traz ótimas recordações. Muito lindo msm.!!!!!
ResponderExcluirObrigada por trazer à tona um dos mais lindos textos da literatura brasileira!
ResponderExcluirHá muito tempo eu procurava por ele, e, por acaso encontrei aqui!
Valeu sempre Paulo Mendes Campos e vai valer pela eternidade.
PS.Li esse texto há mais de 50 anos atrás!!!
Este texto é delicadeza só. Caiu na minha prova de Portugues no concurso do Instituto de Educação em 1968. Adorei. Lembro que tirei otima nota na interpretação.
ResponderExcluirGrata pela lembrança.
Edir Leite
eu amo esse texto desde a primeira vez que li nunca mais me equeci dele
ResponderExcluirEsta crônica é uma das lindas que li...Talvez pela época: juventude, faculdade, amores, amigos... A sensação que se ocupa do meu coração é a mesma de trinta e cinco anos atrás...
ResponderExcluirFoi o melhor do meu dia, obrigada!
Eu li esse texto lindo, maravilhoso na quinta serie, todo mundo olhando pra mim na sala rsrs. boas lembranças.
ResponderExcluirLi esse texto no meu livro de Língua Portuguesa da 6ª série. Eu tinha 12 anos e me apaixonei pelo pombo. Tenho cópia do texto até hoje.
ResponderExcluirE também mencionei "O pombo enigmático" no meu blog http://acromegalicasp.blogspot.com
Porque o autor relacionaa primavera com o mar?
ResponderExcluirWalther
ResponderExcluirEste texto me lembra o prf Sinval, do Colegio Pitagoras em BH MG, em 1981 ; deste esta epoca admiro os dois o texto e o prf.
Também conheci o Sinval, já que fui seu colega de magistério, até um pouco antes dessa época, em BH: grande coincidência!
ExcluirA primeira vez que li esse texto eu tinha uns 12 anos, tinha ele no meu livro de Língua portuguesa, é maravilhoso, Eu lia e relia várias vezes tanto que eu sei ele decorado ou quase isso.
ResponderExcluir"Tardo, mas ardo!(O Pombo Enigmático) É uma maravilha, não é?
ResponderExcluirEste texto é muito lindo mesmo, delicado e poético... Mas no texto original a pombinha pergunta: " Perdeste a noção do templo?" E creio que aí está o fato de caracterizá-la irônica: templo: espaço X tempo:hora... Ainda o templo como marcação do sagrado... É isto.
ResponderExcluirGrande abraço
Elidamares
é uma cronica ?
ResponderExcluirSim, Gabriel, uma crônica de um de nossos mais celebrados cronistas. Embora, tenha estrutura muito próxima de conto.
ExcluirConheci esse texto em 1974 (anos de chumbo ) .Sesi Hamleto Magnavaca em BH. Professora Luci... Maravilhoso. Nunca mais esqueci..
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