quarta-feira, 23 de agosto de 2017

CERA DA MANHÃ, de Ronaldo Costa Fernandes







Eis que a mãe

surge pela manhã.

Traz o tempo nas veias.

Sentada e imóvel,

ela é a melhor fotografia

tridimensional de si própria.

Tem medo de que

quem esteja ali sentada

seja inflamável

por ser uma cópia de cera.



A mãe o chama

e se incandesce.

É conversa que se consome

e bruxuleia,

ora pavio lúcido,

ora a cera do esquecimento.

Tem medo de que ela se esqueça

dele e, assim, ceráceo e ardente,

enrijecerá a infância,

serão últimos os primeiros passos

e morrerá vivo na memória

da mãe que o perdeu

dentro de seu labirinto

feito de museu e cera.





(Ilustração: Whistler, James Abbott McNeill, 1834-1903, mother)




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