quarta-feira, 2 de novembro de 2016

L' ALBATROS / O ABATROZ, Charles Baudelaire






Souvent, pour s'amuser, les hommes d'équipage

Prennent des albatros, vastes oiseaux des mers,

Qui suivent, indolents compagnons de voyage,

Le navire glissant sur les gouffres amers.



A peine les ont-ils déposés sur les planches,

Que ces rois de l'azur, maladroits et honteux,

Laissent piteusement leurs grandes ailes blanches

Comme des avirons traîner à côté d'eux.



Ce voyageur ailé, comme il est gauche et veule!

Lui, naguère si beau, qu'il est comique et laid!

L'un agace son bec avec un brûle-gueule,

L'autre mime, en boitant, l'infirme qui volait!



Le Poète est semblable au prince des nuées

Qui hante la tempête et se rit de l'archer;

Exilé sur le sol au milieu des huées,

Ses ailes de géant l'empêchent de marcher.



Tradução de Guilherme de Almeida:



Às vezes, por prazer, os homens de equipagem

Pegam um albatroz, enorme ave marinha,

Que segue, companheiro indolente de viagem,

O navio que sobre os abismos caminha.



Mal o põem no convés por sobre as pranchas rasas,

Esse senhor do azul, sem jeito e envergonhado,

Deixa doridamente as grandes e alvas asas

Como remos cair e arrastar-se a seu lado.



Que sem graça é o viajor alado sem seu nimbo!

Ave tão bela, como está cômica e feia!

Um o irrita chegando ao seu bico um cachimbo,

Outro põe-se a imitar o enfermo que coxeia!



O poeta é semelhante ao príncipe da altura

Que busca a tempestade e ri da flecha no ar;

Exilado no chão, em meio à corja impura,

As asas de gigante impedem-no de andar.



Tadução de Jamil Almansur Haddad:



Às vezes, por folgar, os homens da equipagem

Pegam de um albatroz, enorme ave do mar,

Que segue — companheiro indolente de viagem —

O navio no abismo amargo a deslizar.



E por sobre o convés, mal estendido apenas,

O imperador do azul, canhestro e envergonhado,

Asas que enchem de dó, grandes e de alvas penas,

Eis que deixa arrastar como remos ao lado.



O alado viajor tomba como num limbo!

Hoje é cômico e feio, ontem tanto agradava!

Um ao seu bico leva o irritante cachimbo,

Outro imita a coxear o enfermo que voava!



O Poeta é semelhante ao príncipe do céu

Que do arqueiro se ri e da tormenta no ar;

Exilado na terra e em meio do escarcéu,

As asas de gigante impedem-no de andar.



Tradução de Ivan Junqueira:




Às vezes, por prazer, os homens da equipagem

Pegam um albatroz, imensa ave dos mares,

Que acompanha, indolente parceiro de viagem,

O navio a singrar por glaucos patamares.



Tão logo o estendem sobre as tábuas do convés,

O monarca do azul, canhestro e envergonhado,

Deixa pender, qual par de remos junto aos pés,

As asas em que fulge um branco imaculado.



Antes tão belo, como é feio na desgraça

Esse viajante agora flácido e acanhado!

Um, com o cachimbo, lhe enche o bico de fumaça,

Outro, a coxear, imita o enfermo outrora alado!



O Poeta se compara ao príncipe da altura

Que enfrenta os vendavais e ri da seta no ar;

Exilado no chão, em meio à turba obscura,

As asas de gigante impedem-no de andar.





Tradução de Onestaldo de Pennafort:



Às vezes, em recreio, os homens da equipagem

pegam um albatroz, enorme ave marinha

que segue, companheiro indolente de viagem,

o navio que sobre o atro abismo caminha.



Mal no convés se vê, todo desconjuntado,

logo esse rei do azul, em passos desiguais,

como dois remos, põe-se a arrastar a seu lado,

desajeitadamente, as asas colossais.



Esse alado viajor, como é grotesco andando!

Ei-lo horrível e inerme, ele que antes pairava!

Um chega-lhe o cachimbo ao bico, e outro, coxeando,

arremeda no andar o pobre que voava!



O poeta é o albatroz que nas nuvens se espraia,

que ri dos vendavais e afronta as setas, no ar;

exilado no solo, em meio ao riso e à vaia,

suas asas de gigante impedem-no de andar.



Tradução de Delfim Guimarães:



Às vezes no alto mar, distrai-se a marinhagem

Na caça do albatroz, ave enorme e voraz,

Que segue pelo azul a embarcação em viagem,

Num voo triunfal, numa carreira audaz.



Mas quando o albatroz se vê preso, estendido

Nas tábuas do convés, — pobre rei destronado!

Que pena que ele faz, humilde e constrangido,

As asas imperiais caídas para o lado!



Dominador do espaço, eis perdido o seu nimbo!

Era grande e gentil, ei-lo o grotesco verme!...

Chega-lhe um ao bico o fogo do cachimbo,

Mutila um outro a pata ao voador inerme.



O Poeta é semelhante a essa águia marinha

Que desdenha da seta, e afronta os vendavais;

Exilado na terra, entre a plebe escarninha,

Não o deixam andar as asas colossais!





Tradução de Teófilo Dias (1854-1889):



A Arthur de Oliveira



O nauta, muita vez, por diversão, costuma

Apanhar o albatroz, águia dos mares largos,

Que segue desdenhoso a esteira de áurea espuma

Da nau que talha a onda em vórtices amargos.



Mal se expõe do convés ás gargalhadas francas,

O herói, que aos céus vingava os páramos extremos,

Deixa piedosamente as grandes asas brancas

Colherem-se nos pés, como esquecidos remos.



Como a envergura audaz comicamente agita,

Sem o garbo, o primor, que altívolo ostentava!

Um, metendo-lhe ao bico um ferro em brasa, o irrita;

Outro — inválido — apupa o enfermo que voava!



O poeta é como o rei do etéreo azul profundo,

Que ama os tufões, e fita, em face, o sol radiante:

Da turba exposto ao rir no exílio deste mundo,

Impedem-no de — andar — as asas de gigante!



Tradução de Felix Pacheco (1879-1935):





Muita vez, por brinquedo, os homens da equipagem

Deitam mão, no alto oceano, a albatrozes ousados,

que, num voo indolente, acompanhando a viagem,

seguem a nau que fende os abismos salgados.



E, mal no tombadilho assim os vão pousando,

como esses reis do azul se aviltam logo, esquerdos,

As asas sem medida e brancas semelhando

Dous remos laterais que se arrestassem lerdos!



Tão belo, não faz muito, e, ora, que cousa ignava!

O nauta audaz dos céus, como parece à toa!

Qual com um cachimbo aceso o bico lhe irritava,

E outro zomba, a coxear, do enfermo que não voa.



A seta e o raio entanto olhara com denodo,

E o Poeta é em tudo igual a esse príncipe do ar:

Exilado na terra, em meio a vaia e o apodo,

As asas de gigante o impedem de marchar!





Tradução de Pedro Mohallem:



No tédio, é bem comum que os marinheiros peguem

À força do alto-mar imensos albatrozes

Que, indolentes, a nau acompanhando, seguem

A deslizar por sobre os pélagos atrozes.



E basta que ao convés arremessados sejam

Para que os reis do azul, acanhados e mancos,

Deixem tombar consigo as vastas mãos que adejam

Qual se fossem um par de longos remos brancos.



Pobre alado viajor, como é canhestra e lassa

Sua figura outrora altiva e ora tão feia!

Um, tomando um cachimbo, irrita-o com a fumaça,

Outro, a zombar do enfermo órfão do céu, coxeia!



O Poeta é semelhante a esse nobre superno

Que, acima, ri do arqueiro e afronta os vendavais:

Exilado no chão, preso ao mundano inferno,

Vacila rastejando as asas colossais.





(Ilustração: Mervyn Peake - albatros)



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